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sexta-feira, 26 de outubro de 2012

"A REVISTA DO ANO - O OLIMPO CARIOCA"

 Rogério Freitas (Hefaísto), Alcemar Vieira (Dionísio) e Helga Nemeczyk (Labareda), em "A Revista do Ano - o Olimpo Carioca"
(foto Eduardo Alonso)

CRITICA TEATRAL
IDA VICENZIA FLORES
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)

Estreou, no Teatro Clara Nunes, no dia 25 de novembro de 2012, "A Revista do Ano - o Olimpo Carioca", texto de Tania Brandão, com direção de Sérgio Módena; direção musical Marco Pereira e coreografia Sueli Guerra. Tudo com a supervisão de João Fonseca. Estes cinco nomes trouxeram de volta as "revistas do ano". Arthur Azevedo, nos idos do século XIX, as instaurou e, em boa hora, Tania Brandão as reinaugurou. Não devemos esquecer que Tania, antes de ser uma especialista em teatro, é também uma historiadora (sua formação é Historia), daí a precisão do texto: "pero sin perder la ternura, jamás!". Tania captou o que acontece agora, com um olhar bem humorado e carinhoso sobre o Brasil. Quanto aos políticos... Democracia é pra isso mesmo, ora!                                 
     Como sabemos, as revistas do ano representavam - e representam agora! - uma brincadeira democrática que envolve o povo e os poderosos da ocasião. Como diz Tania: "quem estuda hoje a revista de ano se surpreende: é impressionante como ela traduz um ponto de vista cidadão, questionador, participativo". É isso. Juntos, os quatro elementos, fogo, terra, água  e ar, ou seja: Tania, Sergio, Marco e Sueli, criaram essa participação, e a plateia, entusiasmada, comemorou o acontecimento. Vamos a ele.  
     Como diz a autora, "uma cena se inventa". Foi a partir de sua imaginação que surgiu a Labareda! (Helga Nemeczyk), uma adaptável chama, que tira "de letra" todas as situações. Essa chama habitava o Olimpo grego, junto com os deuses Hefaísto, do fogo (Rogerio Freitas) e Dionísio, do vinho (Alcemar Vieira). Cansados com a pasmaceira e a decadência das hostes gregas, resolveram os três descobrir outras paragens. Adivinhem aonde eles foram parar? Pois é: no Rio de Janeiro! Embora essa ideia não seja tão original assim, a maneira pela qual ela foi sustentada (e desenvolvida) é que faz a soma.
     Durante uma hora e meia - e não sentimos o tempo passar - fatos recentes da história desfilam diante de nossos olhos, sempre sob o olhar carinhoso de Labareda, à procura de seu bom amigo Hefaísto, o fogo (Rogério Freitas, uma vocação para a comédia), que se perdeu da dupla Dionísio e Labareda, na explosão da viagem grega! O  espetáculo é um bom pretexto para o público fazer uma viagem crítica ao Rio de Janeiro, suas explosões de bueiros, seus bairros agitados, seu povo. E o texto vai comentando as novidades estruturais do "futuro do prefeito" (Édio Nunes) - e surpreendemos as brincadeiras com a gramática, e as siglas! - UPPs, UPAs, Zona Portuária, BRTs, queda da Perimetral (excelente cena, com os desenhos de Gentileza no figurino). Perimetral (Ana Carbatti)  se vinga de sua decadência desejando um engarrafamento monstro para uma Zona Portuária sem ela!
     E o jogo de "A Revista do Ano" se faz, com o nosso Rio e sua  parceria com a "República" (Stela Maria Rodrigues) e o "Brasil" (Celso André), casal que tem ótimas cenas, e "promete" ajudar os cariocas, desde que não sejam perturbados pela "Imprensa"! É aí que surgem as mazelas cariocas, comentadas com muito bom humor pelo elenco. Temos o Escândalo (um "agitado" e excelente Milton Filho) à procura da imprensa marrom para transmitir as novidades. "Escândalo" é um travesti que faz a tradução, para o público - à sua moda bem popular - o que está realmente acontecendo nas "grandes rodas". Hilário. Enquanto isso Labareda só pensa em retornar à sua combalida terrinha, pois naquele lugar onde eles estão "os poderosos só fazem festinha privê". Ela adverte para Dionísio "não vá se fascinar com o poder"  e suas tentações (fascínio esse que atingiu "certos partidos populares" do presente, que a Revista do Ano não cita, mas deixa subentendido). Labareda, a encarregada pelos deuses de não deixar a chama se apagar - e Helga Nemeczyk é uma Labareda insuperável! - acaba aderindo ao charme carioca e não quer mais voltar para a sua abandonada Grécia. Ela e Dionísio (Alcemar Vieira é o simpático bebum grego), fazem um pacto, e se rendem à carioquice geral.
     Nesse meio tempo, entre a chegada dos três gregos e sua eterna permanência na Cidade Maravilhosa, há sugestões de desfiles de escolas de samba; noites na Lapa (o bairro é representado por Ana Velloso, que também interpreta, em outro contexto, uma colombiana hilária); visitas à decadente praia de Copacabana (destaque para Vera Novello e seu "Rap da Vovó Copacabana", que, por acaso, é composição de Tania Brandão e Marco Pereira); encontro com mães de santo (destaque para Ana Carbatti); e com a Lei Seca; com o dinheiro na cueca!, com os índios, enfim - tudo o que tem direito uma comédia crítica.  
     Enquanto isso, os Teatros Clara Nunes, Sesc Copacabana, Carlos Gomes e Theatro Municipal dialogam entre si, com direito a entreato e pano de boca! como nas antigas produções. Os três primeiros "repreendem" o Theatro Municipal por ter aderido à música clássica, em vez de se ligar aos amantes da popular. Há, entre o Teatro Clara Nunes (Stela Maria Rodrigues), e o Espaço Sesc de Copacabana (Marta Metzler), um hilário "papo cabeça". O teatro Carlos Gomes (Ana Carbatti), se apresenta com a sua música preferida, "O Guarani". Estas são apenas algumas, das inúmeras referências e citações com que a autora presenteia a plateia: tudo coroado - em frente ao pano de boca - com a interpretação de uma área lírica, pela voz surpreendente de Mona Vilardo. Édio Nunes e Marcelo Capobiango mandam seus recados: Nunes como "Futuro do Prefeito" e "Cais do Porto", e Capiobiango como "Povo". O que não é pouco.
     O elenco, afinadíssimo, sustenta esse pout-porri de músicas e ação, de maneira gloriosa. Começa com a apresentação de "Labareda", dançada pela própria, música de Vinicius de Moraes e Baden Powell: é o cartão de visitas do espetáculo. A apoteose final se inicia com "Valsa de uma Cidade", de Ismael Neto e Antonio Maria, depois vem Aquele abraço, de Gilberto Gil, depois "Rio 40º", Fausto Fawcet, Fernanda Abreu e Laufer; "Engenho de Dentro", de Jorge Bem Jor, e por aí vai. Durante o espetáculo, músicas como "Benguelê", de Pixinguinha e Gastão Vianna;  "Funk do Bueiro", MC Cezinha da Vila. Termina com Tim Maia cantando "Do Leme ao Pontal"... dá vontade de ver tudo de novo.
     Músicos: Itamar Assiere, Teclado; Nando Duarte, Violão/Guitarra; Ricardo Rente, Sax/Flauta; Humberto Araujo, Sax/Flauta; Pedro Mann, Contrabaixo; Carlos Cesar Motta, Bateria; Firmino, Percussão. Os músicos ficam acomodados no alto do cenário, como o pano de fundo de uma exposição. O cenário é de uma criatividade espontânea, parece ter "brotado", junto com o espetáculo. Cenários e figurinos: Ronald Teixeira & Flavio Graf. Iluminação: Renato Machado; Design de Som: Branco Ferreira; Preparação Vocal: Débora Garcia; Pianista Assistente: Gustavo Salgado. Idealização: Marta Metzler e Marco Pereira; Assessoria de Imprensa, João Pontes e Stella Stephany. 

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