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sábado, 19 de janeiro de 2013

"MARCHA PARA ZENTURO"

Cena de "Marcha para Zenturo", dramaturgia de Grace Passô, direção, Luiz Fernando Marques.
Coletivo XIX/Espanca!
(foto Divulgação) 

CRITICA TEATRAL
IDA VICENZIA FLORES
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro – AICT)
(Especial)

Já dizia Camus (o argelino Albert), nos idos dos anos 40, do século XX: “num universo repentinamente privado de ilusões e de luz o homem se sente um estranho”. Essa seria uma afirmação que conduziria, no pós-guerra, ao rótulo “Teatro do Absurdo, o estranho”. Mas não é coisa do pós-guerra, a juventude de hoje continua a se sentir um estranho neste mundo. Ou ao menos a juventude que pensa. Nela podemos incluir dois grupos que se apresentam, até o dia 20/01, ou seja, até amanhã, no Teatro Nelson Rodrigues, no Rio de Janeiro. Essa fusão de trabalho, essa união entre grupos, o mineiro Espanca! e o paulistano Grupo XIX de Teatro, apresenta uma visão desesperançada do presente (e do futuro).
     Na verdade, os dois grupos estão trabalhando com o “Teatro do Absurdo” (com pitadas de ficção científica), ou nele inspirados (talvez mesmo sem o saber): Beckett, Ionesco, Adamov, Genet, e mesmo Harol Pinter! Autores tão díspares subitamente viram-se navegando no mesmo mar. Entretanto, o mesmo não havia ocorrido (ainda), com os brasileiros, ou melhor, com os grupos jovens como o Espanca! e o Grupo XIX. O parentesco tornou-se óbvio, ao menos com o Grupo  Espanca! já em 2008, quando os mineiros aqui estiveram com a peça “Congresso Internacional do Medo”, inspirada em poema de Drummond.
     Agora, no comentado “Marcha para Zenturo”, os dois grupos se unem para fazer um espetáculo estranho. O Grupo XIX existe desde o início do século XXI (como o Espanca!), e coleciona prêmios com montagens de títulos sugestivos, tais como Hysteria, Hygiene, Arrufos, e agora esse “Marcha para Zenturo”, com direção de Luiz Fernando Marques (Grupo XIX) e dramaturgia de Grace Passô (Espanca!). Neste espetáculo ficamos sabendo da identificação de ambos, e seus questionamentos sobre estilos e escolas.
     “Zenturo” é um possível lugar no futuro, ou um grito de guerra para uma revolução? Nada fica bem claro, na correria louca de incomunicação e amizade que se estabelece  no palco, nessa comemoração do novo ano 2400 e tal. Ficamos com a impressão de que há uma falha na direção, e o reencontro entre amigos não acontece, ou fica somente esboçado. A ação começa a se tornar intrigante a partir do momento em que se intercalam várias situações envolvendo passado e futuro, com atores tchecovianos convivendo com os agitados atores do século 2400. Há comentários desses “seres do futuro” (em tudo semelhantes aos seres do nosso presente), a respeito dos atores do passado: “Como eles são técnicos!”. A junção entre A Gaivota e Nina - com seu realismo -, e o Teatro do Absurdo é uma opção do diretor e da autora, que foram beber na mesma fonte.     
         Resumindo: o que parecia, a um primeiro contato, uma algarravia de atores perdidos no palco, vai aos poucos fazendo sentido, e vamos compreendendo o choque entre passado e futuro. Aí começa a se esboçar um estilo “ficção científica-ao-contrário”, com os “futuristas” (se assim os podemos chamar)  extasiando-se com  máquinas obsoletas como liquidificadores, rádios, engenhocas eletrônicas do início do século XXI, e o funcionamento do corpo humano no longínquo 2012, ou, ainda, a obsolescência da religião... A proposta do espetáculo acaba se esboçando, embora fique apenas em uma promessa.  
        No elenco não há destaques. Aqui e ali identificamos atores do Espanca! tais como o personagem Gordo (Gustavo Bones), ou Marcelo Castro (Patalá), além, claro, de Grace Passô, dessa vez mais autora do que atriz, repetindo gestos que se tornaram a sua marca registrada. Do Grupo XIX pouco (ou nada) conhecemos. Os atores, em geral, cumprem com eficácia os seus papeis. Interessante o destaque dado ao personagem Marco, o enfermo (Rodolfo Amorim), e a crítica que o “coletivo” faz à Medicina. Aguardamos com ansiedade a incursão de “Hysteria”, do Grupo XIX, nos palcos cariocas. (Perdoem se eles já andaram nesta capital. Neste blog sou “a primeira crítica desligada” (embora eficaz), e não me incomodo com rótulos!). Quanto ao mais, registro a ficha técnica. Interessante a movimentação do cenário, o brinquedo com o gelo - que pode ter muitos significados - e a projeção da plateia, ao fundo do palco.

Ficha Técnica:
Concepção do Espetáculo: Grupo XIX de Teatro e Espanca!
Direção: Luiz Fernando Marques
Dramaturgia: Grace Passô
Elenco: Grace Passô (Nina), Gustavo Bones (Gordo), Janaina Leite (Noema), juliana Sanches (Lóri), Marcelo Castro (Patalá), Paulo Celestino (Boris), Rodolfo Amorim (Marco), Rodolfo Serruya (Konstantin) e Mariza Junqueira (Noema) – Temporada Rio
Iluminação: Guilherme Bonfati
Projeto audio-visual: Pablo Lobato
Treinamento de viewpoints: Miriam Rinaldi
Oficina de Interpretação: Ana Lúcia Torre (a conhecida atriz?)
Cenário: Luiz Fernando Marques (que também assina a trilha sonora), Marcelo Castro, Paulo Celestino e Rodolfo Amorim
Figurino: Gustavo Bones, Janaina Leite, Juliana Sanches e Ronaldo Serruya
Assessoria Imprensa no Rio de Janeiro: Astrolábio Comunicação

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