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domingo, 7 de abril de 2013

"PEQUENAS TRAGÉDIAS"

D. Juan (Ana Carbatti) seduzindo Doña Ines  (Renato Carrera), direção Fabiano de Freitas
                                                                 (Foto Divulgação)



CRITICA TEATRAL
IDA VICENZIA FLORES
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)

Para escrever tenho que ter liberdade total, inclusive de escolha. Fui assistir "Pequenas Tragédias" por causa de Pushkin, o iniciador de tudo o que de melhor temos, em matéria de ideia, de texto. Não me interessa quem sejam os atores, desde que sejam bons. Felizmente, foi o que aconteceu na Sala Rogério Cardoso, do Centro Cultural Laura Alvim, Rio de Janeiro: Ana Carbatti e Renato Carrera são bons, e isso basta. Imagine se eu tivesse que ficar rendendo homenagem a Bernadette Peters, por exemplo, só por ser ela uma atriz conhecida na Broadway? Rende-se homenagem porque ela é boa no que faz. Há, no Hemisfério Norte, a possibilidade de os artistas serem somente "de teatro", e, como tal são conhecidos. Ninguém (especialmente a crítica) tem que render homenagem a quem está "em um veículo famoso" e faz teatro para se  exercitar. Como devemos saber, "duas tábuas a uma paixão" (Shakespeare) é um compromisso; penso que elas não têm muita afinidade com a linguagem da mídia! Vemos, com surpresa e paixão, que muitos atores já fizeram essa opção de vida.
     Bem, encerro o desabafo aqui, realizado em essência para responder à atriz do espetáculo, que estranhou essa crítica desconhecer o seu currículo. Falha minha, críticos não tem que conversar com atores, devem, sim, assistir ao seu desempenho em cima do palco! Gente, agora identifiquei Ana Carbatti, ela fez "A Revista do Ano" e eu a adorei! Já fui acusada por leitores, apressados, de só dar destaque a atores que trabalhem na platinada. Não é verdade. E se tal acusação não é "direcionismo", não sei o que essa palavra significa. Pior: ver-se obrigado a ter alguém do elenco na grande mídia para ter público (ou ser público) é uma espécie de imposição que cerceia produtores e críticos. Principalmente a produtores, que são obrigados a fecharem os seus elencos com esse tipo de ator que, afinal, está sempre (com raríssimas exceções) representando a si mesmo.
    Pois bem, o parágrafo acima é política. Crítica também é política. Vamos ao espetáculo. Em primeiro lugar quero destacar a excelência do programa da peça que, sem pretensão, esclarece e encaminha o espectador. Sim, eles dão o merecido destaque a Alexander Pushkin  (1799-1837), esse poeta russo que morreu jovem e que era, por tudo o que realizou, um romântico de cepa. Ele alavancou a cultura atual. Não sei o porquê dos eslavos serem tão geniais, mas ainda vou descobrir. Estive lá assistindo-os, e quase morri do coração. Vamos às "Pequenas Tragédias"!
     O tradutor e pesquisador Sean McIntyre é um estudioso que honra qualquer espetáculo. Ignoro se foi ele quem escolheu o repertório, porém as três pequenas tragédias (e um intróito) selecionadas são uma delícia para olhos e ouvidos do espectador (a tradução, que atualiza alguns termos, foi um achado. Note-se que Pushkin foi um romântico moderno). Une-se a isso uma direção segura (Fabiano de Freitas). Aliás, uma equipe técnica muito bem escolhida, com Sueli Guerra dirigindo os movimentos; Renato Machado iluminando (o sonho de todo simbolista, esse jogo de luz que Machado nos brinda); figurinos acertados e excitantes de Daniele Geammal e a direção musical  de Roberto Bahal (falaremos sobre isso); e o perfeito design de som de Isadora Medella. A  cenografia, que valoriza o espaço, é  de Carlos Alberto Nunes.
     Voltamos a Roberto Bahal porque, certamente, ele não teve dificuldade ao selecionar as músicas, mas fê-lo com o mais apurado senso artístico: o encaixe para o "Requiem" do final de "Mozart e Salieri" NOS FAZ AGRADECER DE JOELHOS. Para não falar das soluções roqueiras que ele dá às manifestações Don juanescas. É muito bom, quando um espetáculo nos pega de surpresa. Como crítica, isso é o menos que posso pedir, para escrever sobre. Portanto, a música teve importância capital para o bom andamento dessa surpresa.
     Passemos à escolha das tragédias. Passemos à interpretação dada por Pushkin a Fausto, Mozart, Don Juan e ao O Poeta e o Editor: algumas com inspiração de mestres anteriores (ou contemporâneos de Pushkin, como Goethe, por exemplo), porém todas impulsionadoras de um futuro para essa Rússia de magníficas obras (Dostô, Tchecov, Tolstoi, tantos! se inspiraram nessa fonte!). Só quem vai à matriz e assiste a palestras, a espetáculos, a recitais, sabe o amor do povo russo a Pushkin! Ele ajuda até  escritores brasileiros a se tornarem melhores contistas e, claro! romancistas.
    Chega de homenagens, vamos aos fatos. O espetáculo começa com o diálogo entre um editor e o artista. O homem de negócios quer convencê-lo a retomar sua lira, para extrair dela a merecida fortuna, o dinheiro que necessitará para viver bem. Ele não percebe que está na presença de um romântico, que só anseia por Liberdade! Renato Carrera (para mim um total desconhecido, a impressão que eu tinha é que estava (salvo o idioma) em um espetáculo russo)! Sonha-se, também, quando se é espectador! Aliás, tenho um amigo francês que pensa ter o idioma português o mesmo ritmo e acento russo...
   Unindo-se ao prazer de conhecer Renato Carrera, vemos, na interpretação de Ana Carbatti, que estamos em boas mãos. A partir desse momento (os primeiros minutos de um espetáculo são cruciais), podemos desfrutar e respirar tranqüilos, pois, certamente, o que virá depois será auspicioso! E ninguém, na platéia, tem a menor dúvida disso. Vemos, a seguir, Fausto (Ana Carbatti) entediado; Mozart (Carrera) e Salieri (Carbatti) em momentos inspirados, tendo por desfecho o Réquiem, de Mozart! E D. Juan (Carbatti), buscando o seu próprio infortúnio, querendo-se vítima de "O Convidado de Pedra"! Cenas muito boas. Fabiano de Freitas está de parabéns, por não ter estremecido de excitação e colocado tudo a perder. Penso que este é o papel do diretor, segurar a emoção, e jogá-la nas horas certas, para que os atores não se percam. Estamos diante de uma jóia rara, um  mecanismo de precisão. Não percam este espetáculo! É teatro, e dos bons!

Idealização e Realização:  Ana Carbatti e Sean McIntyre
Assessoria de Imprensa: João Pontes e Stella Stephany       
            

3 comentários:

  1. Caríssima Ida,

    Em primeiro lugar, eu gostaria de agradecer imensamente a sua presença em nosso espetáculo e expressar meu contentamento em sua apreciação pelo trabalho: o reconhecimento é confortante para o artista e, para mim, diferente do Poeta, personagem de minhas PEQUENAS TRAGÉDIAS, elogios não são um barulho cansativo!

    Lamento muito, porém, que você tenha interpretado minha resposta negativamente e a tenha lido como uma necessidade carente de reconhecimento!

    Tomarei a liberdade de usar, como você, este espaço para humildemente, desfazer esse malentendido e deixar claro que JAMAIS esperei e/ou exigi que QUAISQUER pessoas, do meio teatral ou não, colecionasse meu trabalho ou meu rosto em memória. Muito menos a respeito daqueles que realizei nos veículos de mídia, onde figuro muito rara e quase que insignificantemente!

    Se bem lembro, minha resposta para com sua vaga pergunta referiu-se às minhas bases de formação: Uni-Rio e CAL. Mencionei Maria Esmeralda, que lhe acompanhava naquela noite e os longos anos nessa labuta.

    Peço sinceríssimas desculpas por não ter dado a atenção devida à sua pergunta, de modo a respondê-la satisfatóriamente, provocando tal desconforto.

    Espero muito honesta e humildemente que venha a ter uma nova oportunidade, de encontro, desta vez com tempo de conversa suficiente, para que eu possa desfazer a má impressão que lhe restou sobre minha pessoa e sobre como me represento.

    Ana Carbatti

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  2. Cara Ana,

    penso que o malentendido está desfeito. Terei o maior prazer em conversar, eventualmente, sobre a nossa pgrande aixão que é o teatro.

    Ida Vicenzia

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  3. Pessoas movidas a paixão! Que eloquência! Amo isso tudo!

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