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quarta-feira, 17 de julho de 2013

"BEATRIZ"

"Beatriz", direção Daniel Herz. Na foto Paulo Hamilton (Paulo Donetti) e Ana Paula Secco (Beatriz)     
                                (foto divulgação Dalton Valério)



CRÍTICA DE TEATRO
IDA VICENZIA FLORES
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)

"Um ressentido à procura de uma justificativa para se livrar de algum tapete infantil que lhe retiraram dos pés" é a justificativa de Paulo Donetti, o escritor (interpretado por Paulo Hamilton), para destilar tanta amargura e ironia a respeito dos escritores? Ninguém sabe, ao certo, o que move um escritor a realizar a sua obra, não é mesmo? "Beatriz", reestreia do Teatro do Leblon, Rio de Janeiro, é a grande procura dessa descoberta. 

     A adaptação de Bruno Lara Resende para o livro de Cristóvão Tezza, "Um erro emocional" e dos contos de "Beatriz", também de Tezza, vão além do jogo dos atores, ela desvenda o mistério que é o pensamento (não articulado) entre as pessoas. Não conhecemos os originais, mas certamente o trabalho de Lara Resende (organizar essa estrutura) dá vida ao contexto. Talvez, neste espetáculo, o público tenha oportunidade de testemunhar o primeiro contato: o mais intenso- de um relacionamento que se constroi. O final do espetáculo nos brinda com algo belíssimo, raro em teatro. 

      A constante troca entre pensamento e diálogo, de "Beatriz", faz com que o público participe, vivamente, da construção afetiva que brota entre um homem e uma mulher: uma mistura de encantamento e submissão que, em boa hora, a dupla de atores desenvolve. O cenário de Aurora dos Campos que se desloca, estabelecendo vários espaços para o encontro do casal, está muito bem desenvolvido e trabalho com perfeita afinação com a luz de Aurelio de Simoni, dinamizando a ação. Também o jogo corporal estabelecido pela diretora de movimento do espetáculo, Márcia Rubin, dá leveza e agilidade ao desempenho dos atores, agilidade essa facilitada pelos figurinos de Patrícia Muniz. A ressaltar o sex-appeal acrescentado à personagem feminina pela audácia de seu figurino, quase uma lingerie. Belíssimo! A trilha sonora de Lucas Marcier e Fabiano Krieger é marcante.

     Enquanto os atores vão se familiarizando - e ao público - com a linguagem (original) do espetáculo, a dinâmica dessa linguagem complementa o texto. Um bom exemplo é o afastamento paulatino de Caio - o escritor rival de Donetti na conquista da fêmea, e na vida literária- através do afastamento da "cadeira amarela", que o simboliza. Uma vez eliminado o rival, ficam somente os personagens e o desejo de realização amorosa. 

     E é aí, neste orquestrar de tons e expressões, que podemos avaliar o trabalho de direção de Daniel Herz. Há toda uma dinâmica entre a fala e o pensamento que deve ser muito bem compartilhada pelos atores, para dar clareza ao intrincado do texto: há todo um desafio de sincronismo. A rapidez com que as falas e os pensamentos são trocados estabelece uma crescente tensão, que atinge seu ápice na cena final, reveladora. Ana Paula Secco e Paulo Hamilton seguram muito bem o desafio, estabelecendo grande empatia entre público e personagens. Aconselha-se, com veemência, a experiência de assisti-los. É bom ver bom teatro. 

Ficha técnica: Texto: Cristóvão Tezza; Adaptação: Bruno Lara Resende; Direção: Daniel Herz; Figurinos: Patrícia Muniz; Direção de movimento: Márcia Rubin; Iluminação: Aurélio de Simoni; Cenário: Aurora de Campos; Trilha sonora original: Lucas Marcier e Fabiano Krieger; Projeto gráfico Mauricio Grecco; Consultoria psicanalítica: Evelyn Disitzer; Preparação vocal: Leila Mendes; Assessoria de Imprensa: Lu Nabuco.

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