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sábado, 20 de janeiro de 2018

"TOM NA FAZENDA"


                             

                Vaz, Babaioff e o olhar de Ecard em "Tom na fazenda",
direção
    Rodrigo Portella (foto divulgação)

IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)

     Eis uma peça de teatro difícil de julgar, porque apresenta uma mistura de situações - diria estilos - que não se enquadram na convencional maneira de analisar texto e interpretação. Trata-se de um drama? De uma tragédia? De uma tragicomédia? O único que sabemos sobre ela é que dá  ocasião (enorme) para quatro atores mostrarem sua capacidade de atuação.
     Algum crítico menos prevenido poderia considerá-la pós-moderna (?) pelo fato de envolver tantas linguagens cênicas? Ou talvez um drama moderno no estilo dos norte-americanos Eugene O'Neill, Tennessee Williams e outros tantos? Fica a questão. O fato é que ultimamente o teatro moderno tem dado passos inacreditáveis em direção ao horror. Passemos a essa historia de horror. Insisto: comedia?
     Eis o tema: sofisticação/em confronto com primitivismo. Bons sentimentos/em confronto com desconsideração pelo próximo. Enfim, o texto apresenta... o que uma boa educação católica condena! Pois é. Escrito por um canadense da região do Quebec, portanto, de ascendência francesa, onde se misturam bons celtas, e não menos ótimos latinos. Vá entender! Ou talvez seja por isso mesmo que a confusão se estabelece. Com pitadas da "idiotia rural" de Marx! O tema é a selvageria, e está preparada a sopa. Vamos a ela.
       O nome do autor é Michel Marc Bouchard. Seu texto ultrapassa os de Bernard-Marie Koltés, outro autor que atrai (no bom sentido) a juventude - ou os não tão jovens assim - de hoje. Amo Koltés. Pois bem, digamos que Bouchard não possui tanta sutileza assim, o que se propõe fica escancarado. Ah! Se fica!
     A começar por Kelzy Ecard, a nossa Bette Davis moderna (o olhar!), que já começa mostrando a vida miserável a que o ambiente rural a levou! Seu personagem, nada fácil, escancara os preconceitos e a má vontade que podem se estabelecer em um ser humano levado a viver sem perspectivas. Enfim, outra interpretação magistral de nossa querida Kelzy.
     Em matéria de atrizes a peça está bem provida. Há uma comediante nata, Camila Nhary, que possui um inglês cachorral e se sai muito bem na confusão reinante. Claro, e "quem parte e reparte fica com a melhor parte, ou é bobo..." etc, etc... os homens botam pra quebrar! Só dá eles! Armando Babaioff (nunca o tinha visto em cena, surpresa), é o idealizador do projeto, o tradutor da peça e um dos personagens centrais. Realiza, com perfeição, os papeis que se atribuiu. Parabéns. (Ele interpreta Tom, o sensível e urbano Tom).
    Em contraponto temos o irmão de seu namorado morto, interpretado por Gustavo Vaz, em papel tão selvagem quanto se imagina ser a vida na roça. Ou pior. A fazenda está matando aquele homem. Talvez, desde Marlon Brando, em "A Street Car...", tenha visto tanta selvageria. Não, Vaz é mais selvagem ainda.
     Enfim, sobrevivemos todos a tanto primitivismo. Em matéria de teatro e desempenho dos atores - Nota 10.

FICHA TÉCNICA: Além do já citado tradutor e ator, temos: Direção: Rodrigo Portella (outro que tenho ouvido falar muito, e que fico devendo presença). Como diretor, penso que Rodrigo é uma grande aquisição para o nosso teatro. Cenografia da sensível Aurora dos Campos, que consegue transformar o palco em um circo de horrores, auxiliada pela iluminação de Tomas Ribas (destaque para Babaioff/Tom encerrado em um portamalas de carro!). Figurino contemporâneo de Bruno Perlatto. Direção Musical Marcelo H com guitarras e violão, acompanhado por Jr. Tostoi. Preparação Corporal Lu Brites (não a conhecia. Excelente!). Coreografia: Toni Rodrigues.                      

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