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quarta-feira, 29 de junho de 2016

"O BURGUÊS FIDALGO"

Toilette de M. Jordain

Mme. Jordain

Marquise Doriméne e Conde Dorante, o nobre falido

O professor de francês e M. Jordain
(qualquer semelhança do professor com a Marquise é mera coincidência). 

Uma perfeita tradução de "classe social".
(FOTOS DE ANDRÉ STÉFANO)
IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro – AICT)
(Especial)
O BURGUÊS FIDALGO

     Em final de excursão, encontramos os Parlapatões se despedindo com “O Burguês Fidalgo”, de Molière, no Teatro Amazonas, em Manaus. O diretor Hugo Possolo esteve presente, no elenco, e proporcionando, na capital manauara, um encontro/debate com a classe teatral amazonense.

     Interessante excursão de grupo tão conhecido no Sudeste do Brasil que, ao recriar o espírito de Molière, o faz como se “o criador da comedia francesa” andasse em sua ambulante “carroça de Téspis” por este mundão. Explico: antes de Luis XIV e Versailles, Jean Baptiste ganhou estrada e, como é do conhecimento de todos os que amam teatro, de Lyon a Paris, suas peças ficaram conhecidas no mundo inteiro, graças as extravagâncias do rei francês.

     Pois os artistas dos Parlapatões, com sua verve habitual, conseguem a façanha de adaptar Molière às terras por onde passam, o que torna o espirito do criador francês mais vivo ainda. A “colaboração” das capitais visitadas, entre elas Belém, Goiânia, Belo Horizonte, e outras mais, do Norte e Nordeste, fizeram deste Molière “abrasileirado” um sucesso total.  Em Manaus tivemos a citação, no texto, de o "Encontro das Águas"descrito pitorescamente pela soubrette Nicole! E também, nos improvisos do grupo há a colaboração dos igarapés, do tacacá e outros aspectos característicos da região. Misturado a tudo isso, orgias de teatro burlesco, lembranças políticas das confusões atuais, e muita comicidade popular. Nada faltou a esse Molière parlapatão!

     Os Parlapatões não caíram do céu, o projeto é apoiado pelo (ex?) Ministerio da Cultura e Vivo EnCena. Não sabemos se projetos ligados a esse Ministerio se manterão em pé, com a “nova ordem” que assola o Brasil e a Cultura, com o atual “desgoverno” (Temer, o inacreditável), mas enquanto houver condições de grupos interessantes como o impagável Parlapatões excursionarem pelo Brasil, os eventos acontecerão.

     Quanto ao divertido espetáculo que os Parlapatões proporcionaram ao público de Manaus, um burguês fidalgo com “costuras” populares brasileiras que às vezes tornam irreconhecível o original, retomando, aqui e ali, a historia de Molière. Essa peculiar adaptação, feita por Adonis Comelato, Hugo Possolo e Rafael Faganiello, retoma, para espanto do público, a historia do burguês que quer se tornar fidalgo custe o que custar, sugerindo um  Brasil de classe média ascendente em sua ânsia de se tornar “refinada”, tal como nos tempos dos idos de Versailles. Esta encenação utiliza várias linguagens da comedia, inclusive o teatro burlesco.  

     Em linhas gerais, “O Burguês Fidalgo” é uma comédia balé de Molière e Lulli (música), que critica personagens ridículas. Quanto ao elenco, percebe-se a coesão e as benesses de um trabalho que se mantém afinado há vários anos. Hugo Possolo, como o burguês M. Jordain, ultrapassa, em muito, aquele contido burguês das interpretações francesas. Há, no burguês de Possolo, além da parvoíce hilariante do personagem de Molière, um toque cafajeste bem brasileiro, quando entra em disputa com o conde Dorante (interpretado por Fabek Capreri), para “comer” a marquesa Doriméne (interpretada por Alexandre Bamba). Também  Mme. Jordain é um homem (Raul Barreto), o que aumenta a estranheza e dá vigor às duas personagens femininas. É uma delícia vê-las em cena! Olhares sutis e gestos desdenhosos pautam a interpretação irretocável de Bamba como a Marquesa. A decidida Mme. Jordain é uma fonte inesgotável de sabedoria e perspicácia, com o ator Barreto nos apresentando uma visão estranha de Mme. Essas duas interpretações acrescentam estranheza (e originalidade) ao conjunto dos atores.


     Nicole, a soubrette (Livia Camargo); Lucile, a filha Jordain (Fani Feldman); Cleonte, o noivo (João Paulo Bienemann, que interpreta também o mestre de esgrima) e Fernando Fecchio (Coville, o servo), fazem o contraponto entre noivado popular e noivado burguês. Fernando interpreta também o mestre de dança. Débora Veneziani é a estilista do burguês fidalgo. Está armada a comedia. Figurinos que dispensam cenário, de Cássio Brasil (queremos dizer, com esta observação, que os personagens podem se desenvolver, através de seus figurinos, até mesmo em cenas de rua). Mas o cenário, de telões e cortinas móveis, é de Hugo Possolo, o também diretor e ator (M. Jurdain). Os cenários funcionam muito bem, no Teatro Amazonas. Temos a cantora Dani Nega, que dá vida às músicas de Demian Pinto (que toca, ao vivo, uma pianola), e a outras músicas brasileiras mais conhecidas, inclusive sambas, na trilha sonora elaborada por Pedro Vilhena. A coreografia é de Rogerio Maia. Curador do Projeto: Expedito Araujo. Produtor em Manaus: Sandro Paulo. Assessoria Parlapatões Herika Horn QUEM VIU, TEVE OCASIÃO DE SE REGALAR COM UM MOLIÈRE VERDADEIRAMENTE EXTRAVAGANTE.