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quarta-feira, 24 de maio de 2023

 

UMA CRÍTICA DE DANÇA

Giselle, de Adolphe C. Adam

IDA VICENZIA

 (da Associação Internacional de Críticos (de Teatro – AICT)

 

Quem foi Adolphe C. Adam?

 

Em nossa historia particular do balé, ele foi o criador de Giselle, (embora tenha sido dele também a criação de Le Corsaire, com seu belíssimo pas de deux). Esse balé teria sido mesmo de sua criação? Tão diferentes, em espírito. Mas voltemos a Giselle:  Em nossas andanças, no passado, à procura de balés conseguimos, a duras penas,  assistir ao Primeiro Ato de Giselle, criação do parisiense Adam, de nome e perfill anglais...

Para esta crítica de dança que vos fala,  Giselle era um passo adiante no savoir faire dos franceses. Tratava-se da introdução de sua bem amada Mímica, na linguagem de Terpsicore. Não estamos fazendo confusão. Pelo fato de só ter assistido, até o presente, o Primeiro Ato de Giselle, foi a partir da celebração de 2023 - no Theatro Municipal do Rio de Janeiro – na abertura da temporada de balé, que o Segundo Ato de Giselle lhe foi revelado, e com ele vários mistérios que lhes falarei agora:

Eis que surge o balé completo! E o Segundo Ato se revela uma sequência de balés conhecidos. Eis como a cena do cemitério com suas “mortas” vestidas de branco, nos lembram  as  Wilis de Chopin, com seus noturnos e suas valsas.

Mas a surpresa não parou por aí. Para a plateia, que assistia pela primeira vez o balé completo, o “príncipe” do Primeiro Ato, que deixava a camponesa apaixonada em desamparo, nos mostra, durante todo o balé,  seu lado também apaixonado. O príncipe, como pensávamos, não deixou a camponesa  no abandono. O Segundo Ato nos mostra um príncipe apaixonado, desolado.

A interpretação de Cícero Gomes - um bailarino excepcional - foi de uma beleza clássica irretocável.

No Primeiro Ato surge outro personagem, este em tudo inspirado em Othelo, de Shakespeare! Trata-se do ciumento servo do príncipe? Ou de um camponês? Quem o interpreta com força e desalento, na última apresentação de Giselle, foi o excelente bailarino e mímico José Ailton. Também um belo desempenho, o desse bailarino, mas nada que venha ofuscar o brilho de Cícero Gomes na despedida de Giselle!

A bailarina Márcia Jacqueline dançou Giselle, no dia do encerramento da temporada, e a namorada do príncipe foi interpretada pela bailarina Priscila Mota. Ambas excelentes.

Vários acontecimentos são reconhecidos, no repertorio de Adam. Nomes como Horowitz (revisão da música); Théophile Gautier (adaptando Heinrich Heine);  Helio Bejani e Jorge Teixeira em sua adaptação final.

 

Regência da Orquestra do Theatro Municipal: Jésus Figueiredo.

 

Continuando... E, para aumentar a surpresa com a escrita de Heine, somos informados que Giselle é a quintessência do balé romântico! Nada a declarar, mas, em nossa opinião, cada espectador cria o balé que lhe vai na alma. Para alguns, trata-se de um balé revolucionário, colocado em ação com uma visão corporal na qual entra o jogo mímico.

A montagem também enfatiza os defeitos das majestades, e enriquece a pureza de sentimentos dos humildes. Enfim, este sentimento se destaca na atuação da camponesa Giselle.

Podemos afirmar que entre o príncipe, a princesa e a camponesa Giselle, desenrola-se uma verdadeira luta de classes! Nada mais revolucionário! Mas os velhos tempos de submissão ainda serão os mesmos desde sempre e, no caso, desde o século XIX até nossos dias, apesar da conscientização sobre a humilhação dos humildes, querendo despertar os que vivem no século XXI. Em nossos tempos, como nos tempos de Giselle, a  Liberdade deve ser o caminho para os vencedores. Mas no balé o príncipe deve seguir o seu destino, e  dos submissos: ele não pode realizar seus sonhos. Este balé expõe o sentimento de submissão que ainda impera, em nossos dias. Neste sentido, dando destaque à submissão do personagem, o balé se torna revolucionário, tendo o príncipe que casar com a mulher que ele “não” ama, mas pela qual tem um compromisso de honra, e deixar esquecida a mulher que ele verdadeiramente ama.

Estes são sentimentos e vivências que ainda sobrevivem em nossos dias? Sim.

O balé Giselle aponta para estes “sentimentos e vivências” que são o “sempre” do espírito humano. Concluímos que enfrentamos, em nossos dias, essa mistura diluída de todos os sentimentos humanos, de todas as épocas. Sentimentos esses que estão se transformando em um condicionamento difícil de ser rompido. Neste sentido, e apontando para condicionamento, é que o balé Giselle se torna revolucionário.

 

BELA ESTREIA DA TEMPORADA DE BALLET COM GISELLE !