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domingo, 23 de abril de 2017

A MORTE ACIDENTAL DE UM ANARQUISTA


Três ótimos atores: Henrique Stroeter o delegado,  Dan Stulbach, o louco e Riba Carlovich
 o Secretario 

de Segurança em "Morte Acidental de um Anarquista", de Dario Fó.

Os dois amigos, Stroeter e Stulbach sonhavam em montar esta peça há muito tempo.
Em boníssima hora!
(Fotos: João Caldas Fº)

IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro (AICT)
(Especial)

     Mais Dario Fó é impossível. Este teatro de participação do público, circense, irreverente, nos traz a alegria de ver teatro como deve ser, com os acontecimentos palpitando, se renovando conforme o público, conforme a apresentação! Vi duas vezes, sempre com façanhas novas do momento político muito louco que vivemos. Mais louco só o personagem de Dan Stulbach criado por Dario Fó para seu próprio deleite (ele estreou a peça fazendo o louco). 
     Acontece que Dario se inspirou em um fato real, na sua conturbada Itália dos anos 60 (continua a mesma), no qual um anarquista foi "suicidado". O mais interessante do trabalho dessa equipe de atores (se é que podemos selecionar algum em particular, pois todos  se destacam) é a oportunidade que tem "o louco" para mostrar a compulsão que tem por novos personagens. Uma delícia. Só a interpretação de Stulbach já vale a ida ao teatro. Em matéria de teatro de "deformação" de costumes, tivemos outra encenação bastante interessante, feita, salvo engano, por alunos recém saídos de uma escola de teatro do Rio de Janeiro. Trata-se de uma adaptação do livro "Terra Papagalli", de Torero e Pimenta, livro este que conta a saga do degredado Cosme Fernandes em sua chegada à "Terra de Santa Cruz" e todas as transgressões que lhe foram permitidas (como da hábito, em nosso país). A peça foi dirigida por Marcelo Valle.          
     Por sua vez, o elenco da "Morte Acidental" é composto, além de Stulbach e Henrique Stroeter - os idealizadores do espetáculo (Henrique interpreta o delegado) - temos também em ótimas interpretações Riba Carlovicci, como o secretario de segurança, Maira Chasseraux, a jornalista, Marcelo Castro interpretando Bertoso, o comissário de polícia, e Rodrigo Beladona o guarda. Dan Stullbach faz, no início, uma ligeira apresentação dos mesmos.
      Ah! E tem também o impagável Rodrigo Geribello, ator e músico, interprete das mudanças de cena e dos ruídos ambientais. Muito bom. 
     Claro, Dario Fó sabia o que estava fazendo em termos de comedia popular  - essa sua mistura de Commedia del Arte e teatro popular faz o público participar. A direção de Hugo Coelho traz "acréscimos" ao elenco. Ou melhor, "permite" improvisações! Da segunda vez que assisti o elenco divertia-se muito, mas  não mais do que o público que participava do jogo de conscientização feito neste trabalho de Fó e Coelho. As coisas que aconteceram na Itália (corrupção, morte) podem (e estão acontecendo agora), também no Brasil.  
     O teatro é um tabuleiro aberto. Imaginem a colaboração dos atores, no sentido da comedia descomprometida. Por exemplo: quando Henrique Stroeter faz o seu número de balé clássico (!) um dos atores comenta: "é um genérico de Ana Botafogo...". Irreverente, popular, o espetáculo, mas a "desinibição" aumenta e a nossa atual "republica" é um banquete e os atores comentam e criam novas situações, cheios de segundas intensões: "o escândalo é o sal de frutas da democracia". E quando o "louco" se traveste em um "juiz da situação", de um colaborador, ele cria uma metáfora na qual afirma que a agressão policial é uma "massagem terapêutica". E a repórter, coitada (a ótima Chasseraux) tentando cumprir o seu papel (dessa vez a imprensa parece interessada realmente em apurar os fatos) e recebe até tapa na b...! Será que exagero? Ah! O "louco" obriga os dois policiais a cantar Vandré: "Caminhando e cantando..." Hilário. NÃO PERCAM!    
    
FICHA TÉCNICA:
Autor: Dario Fó. Tradução: Roberta Barni. Direção Hugo Coelho. Música e sonoplastia: Rodrigo Geribello. Cenário: Marco Lima. O Figurino (ótimo) é de Fause Haten (engraçado, fiquei com a impressão de que o juiz aparecia com a capa preta, na primeira vez que assisti, e não com um capote xadrez, como da segunda vez. Será verdade?). Produtores Associados: Selma Morente, Célia Forte e Dan Stulbach. Assessoria de Imprensa Rio: Eduardo Barata.   


terça-feira, 11 de abril de 2017

UM AMOR DE VINIL

Françoise Forton e Mauricio Baduh em "Um Amor de Vinil", texto de Flavio Marinho, direção André Paes Leme.

IDA VICENZIA
( Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial Rio)

     Flavio Marinho nos traz à cena um momento de romantismo e comedia com o seu texto "Um Amor de Vinil" fazendo o público transitar entre compositores como Getulio Cortes, na música imortalizada por Luiz Melodia, "Negro Gato", que Françoise Forton interpreta, abrindo a cena com muito humor e ironia. A direção é de André Paes Leme, e essa é uma estréia do Teatro Fernanda Montenegro, no Leblon. São 22 canções românticas, embaladas pelas vozes de Mauricio Baduh, Françoise Forton e Marco Gérard, ator e músico, e Gustavo Salgado no teclado.
     Forton revela seu talento para a comedia, apresentando um "tempo" único para se relacionar com o público. Dotada de uma interpretação sensível, sua voz é explorada com muita competência, dando-lhe ótimos momentos, como em "Nasci para Chorar", música na qual Françoise mostra a que veio, ou seja: encantar o público. Também Mauricio Baduh nos dá uma grande revelação com seu timbre de voz que remete a Roberto Carlos. A dupla tem momentos ótimos. Não podemos deixar de nos referir ao grande final, quando "Falando Serio" é cantado por Baduh e interpretado por Forton, que transmite o sentimento da canção através de sua expressão facial. Momento marcante.       
     O texto de Flavio Marinho faz, com muito humor, alusões críticas aos críticos, a certos musicais e às peças "papo-cabeça". E, sim, Marinho coloca o problema do "alemão" e do "inglês" (Alzheimer e Parkinson) brincando com os "esquecimentos" de Amanda (Françoise Forton). Aliás, o texto brinca também com a morte... com um certo humor funébre. Há, neste texto de Flavio Marinho, um leve despertar da linguagem de hoje, perpassando a troca de papéis entre o homem e a mulher, transmitida através das canções. Observamos que "Começar de Novo" é cantado pelo homem, voltando às raízes, pois Ivan Lins e Getulio Costa a compuseram propondo a liberdade e o renascer do amor, porém a cantora Simone dela se apropriou, tornando-a praticamente um hino  feminista!
     Não sabemos se Marinho e Paes Leme (na direção), tiveram a iniciativa de "espicaçar" esse lado do relacionamento amoroso, a liberdade feminina, em homenagem ao momento muito particular em que vivemos: o relacionamento homem/mulher. O certo é que "Negro Gato" é cantado por uma mulher... embora meio maluquinha, uma empreendedora (tem um negócio, uma loja da discos de vinil muito procurada), o que já é uma proposta de liberdade financeira. O autor chega perto da discussão dos papéis sociais, e como esse não é o tema da peça... fica somente a sensação da liberdade da mulher e da fragilidade do homem! Eis um caminho novo para os novos musicais...    
     Figurinos: do cotidiano, de Ticiana Passos. Direção Musical Liliane Secco. Iluminação Paulo Denizot. O Cenário de Carlos Alberto Nunes convive com o outro espetáculo da produção "Nós sempre teremos Paris..." e a "loja" se transforma em um "bar", permanecendo nele os muito bem bolados cubos portáteis com imagens dos antigos discos de vinil... Direção Coreográfica de Marina Salomon. Produção Barata Comunicação. É  BOM  VIVER  ESTE  MOMENTO  DIVERTIDO!      





    

segunda-feira, 3 de abril de 2017

RENATO RUSSO







     Bruce Gomlevsky em "Renato Russo", direção de Mauro Mendonça Filho, texto de  Daniela Pereira de Carvalho. (Foto Guga Melgar).


IDA VICENZIA
(Da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)
RENATO RUSSO

     Em cena, em curta temporada, temos o regresso de "Renato Russo", dessa vez no  Teatro das Artes. Como sabemos, este é um espetáculo que deu todos os prêmios a Bruce Gomlevsky, e à equipe do espetáculo, pelo desempenho excepcional que apresentaram. O texto, de Daniela Pereira de Carvalho destaca, com acerto, as principais passagens da vida de "Russo", aliás, um nome escolhido pelo jovem Renato Manfredini Jr., quando resolveu assumir seu talento. O texto - e sua vida - estão muito atuais. Renato viveu na época da ditadura militar... Não esqueçamos que uma das composições marcantes deste poeta é "Que país é esse?" - canção que se tornou um grito de guerra contra a injustiça, e que inspirou muitos poetas. Nada mais atual, essa Legião Urbana, a banda de Renato Russo, e nada mais atual do que relembrar as composições de Renato.  Vale à pena assistir novamente Bruce Gomlevsly - para quem já o assistiu - e para quem ainda não teve essa experiência ... não deve perdê-la!
        Vamos a ela: um cenário funcional (de Bel Lobo), no qual a ação se desenvolve no interior de seu pensamento, recolhido em seu quarto, ou criando músicas e as interpretando, na presença de seu público. O acertado desenho de luz de Wagner Pinto faz a transfiguração dos tempos, e vemos tudo acontecer na nossa imaginação, e ao vivo, no desempenho de Bruce Gomlevisky! A direção de Mauro Mendonça Filho revela um jogo premiado: o diretor soube aproveitar, com detalhes, todo o material precioso desta produção, contando com uma equipe de primeira. Além dos citados, temos a direção musical de Marcelo Alonso Neves e a música ao vivo da banda Arte Profana. Mas, o que impressiona mesmo, e dá vida aos momentos que passamos no teatro, é o desempenho de Bruce Gomlevsky. Antonio Abujamra dizia - quando deixou "seu lado ator" vir à tona - o quanto passou a amar melhor, a compreender melhor, o "metabolismo" destes seres maravilhosos. No caso de Bruce, tivemos uma experiência esclarecedora a respeito das palavras de Abu, ao compartilhar o espetáculo, e, principalmente, a cena em que ele canta "É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã"... segurando as mãos do público e cantando... o artista que estava ali presente não era Bruce Gomlevsky, mas Renato Russo!  Essa sensação nos acompanha durante todo o espetáculo.
     Para quem não sabe, Renato Russo é um dos nossos artistas mais sensíveis e um de nossos poetas mais importantes. Viveu o seu tempo com entrega total, e soube criar os mais belos poemas sobre a nossa realidade... sobre o homem, e o que é o ser humano. Assim, simplesmente. Coisa de artista e seu "metabolismo". Desde a observação que tem sobre a vida, a sua delicadeza, e a revolta de não poder modificá-la.
     Renato Russo, o compositor que é capaz de suaves composições que são verdadeiros contos de amor (bem humorados) como em "Eduardo e Monica", no qual ele pergunta: ""Quem um dia irá dizer/Que existe razão/ Nas coisas do coração?". Foram mais de 200 composições, feitas por este coração aberto à emoções, e ele se desespera com: "Nas favelas do senado/ sujeira pra todo lado/ ninguém respeita a Constituição/ mas todos acreditam no futuro da nação", perguntando: "Que País é esse?" Ou  "Pais e Filhos" ... e tantas outras! Algo que não ser esquecido, realmente. Estão de parabéns os que tiveram a lucidez de reapresentar esse "Renato Russo" tão bem vindo. 
  
     Assistente de Direção: Ana Kutner; Figurino: Jeane Figueiredo; Videografismo: Rodrigo Lima, Cila Mac Dowell, Gustavo Vaz; Direção Vocal: Patricia Maia e Deco Fiori; Preparação Corporal: Daniela Amorim; Técnica de Alexander, Gabriela Geluda; Fotos Divulgação: Guga Melgar; Rede Social, Rafael Teixeira; Assessoria de Imprensa: Barata Comunicação
Produtores Associados: Bruce Gomlevsky e Bianca De Felippes