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domingo, 16 de dezembro de 2018

"OUTROS"

Resultado de imagem para FOTOS "OUTROS" GRUPO GALPÃO

Grupo Galpão. Teuda Bara à frente. Muita música, dança, morte e vida! Muito texto!
Cenografia Marcelo Alvarenga.
Direção Marcio Abreu (Foto Guto Muniz).
IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro – AICT)
(Especial)
“OUTROS”
     A obra de arte tem várias leituras, e entra no coração de quem a reconhece. Assim é. “Outros” é a obra de arte de um grupo de teatro que teve a coragem de se aproximar do público mostrando o seu abismo – que também é o nosso - e confessou seu MEDO, já que o medo é o princípio de tudo.
     Será o recomeço do Grupo, outro envolvimento? Dessa vez com Marcio Abreu.
     Poesia pura!
     É bom entrar neste mundo fracionado do Grupo Galpão “onde o abismo é a vertigem única, o principio de tudo ... onde o abismo é o nada!”
     Na literatura tínhamos visto o abismo, mas nunca tão presente como agora, neste teatro. Entramos nele, podemos tocá-lo. “Eu não quero me calar” – eles gritam, e nunca seu canto chegou tão perto de nós. É verdade que não assistimos ao grande momento em que tudo recomeçou, mas presenciamos agora o caminho que nos trouxe até aqui. E como é bom entrar neste mundo... “deles”... “nosso”!
    “O abismo, a vertigem imensa do principio de tudo. O MEDO”.
     “Eu não quero me calar” – eles gritam.
     Filigramas...! Dança! Dança! Grande Tchaikovsky! E eles perfazem o caminho com música, dança, fala, encontro, desencontro, emoção! E têm a coragem de terminar com o que é nosso, com Villa Lobos! “Acorda, vem olhar a lua/ que brilha, na noite escura...// “Quisera saber-te minha/ Na hora serena e calma... (...) “Quando dentro da noite/ Reclama o teu amor...” !
     Este é o caminho do encontro/ que também é o nosso. Então... é assim!
     Obrigada, Grupo Galpão, por este momento tão estranho, tão belo.
     Para nós, que nos encontramos tão fracionados, tão perdidos neste viver/morrer.  
     E viva o “mesão”! E vivam os atores! Antonio Edson, Arildo de Barros, Beto Franco, Chico Pelucio, Eduardo Moreira, Fernanda Vianna, Inês Peixoto, Julio Maciel, Lydia Del Picchia, Paulo André, Simone Ordones, Teuda Bara.

     E viva quem começou tudo isso, e quem já dirigiu o Grupo Galpão! Viva Fernando Linares, Eduardo Moreira, Paulinho Polika, Carmen Paternostro, Antonio Edson, Eid Ribeiro, Gabriel Villela, Cacá Carvalho, Chico Pelucio, Paulo José, Paulo de Moraes, Julio Maciel, Yara de Novaes, Jurij Alshcitz, Simone Ordones, Lydia Del Picchia, Marcio Abreu.

     TUDO COMEÇOU EM 1982.
     QUERO DIZER: OS ESPETÁCULOS... IMAGINO  QUE  TUDO  TENHA
COMEÇADO  MUITO  ANTES.  NÃO?
     HÁ TAMBÉM “OS CURSOS LIVRES”, E  O “GALPÃO CINE HORTO”, E  O “CENTRO DE PESQUISA E MEMÓRIA DO TEATRO”... E OS EVENTOS... E  A ESTRELA AMARELA!
E NÃO PODEMOS DEIXAR DE ACRESCENTAR O “RECADO DO GRUPO”:

     “A montagem de NÓS, nosso primeiro encontro com Marcio Abreu, gerou muitas alegrias, dúvidas e inquietações. Novos horizontes se descortinavam. Não só na forma mas também no conteúdo e na relação do ato teatral com o público. A peça, que foi construída como uma resposta àquilo que chamamos internamente de “nossa reação diante da ação do mundo em nós”, gerou não só uma matéria que dialogava de forma radical com o momento político do país e do mundo, mas também uma série de indagações sobre o nosso lugar de artistas e a função do teatro e da arte nos nossos tempos.”
     (Este encontro, ao que parece, se deu em 2016, mas pode ter sido antes...).
     O Grupo faz uma Homenagem ao filósofo coreano radicado na Alemanha, BYUNG-CHUL HAN – que escreveu, entre outros livros, “A Agonia do Eros” – sobre a sociedade atual, onde destacamos algo que nos aflige: “O neoliberalismo aciona uma despolitização geral da sociedade onde ele substitui o eros por sexualidade e pornografia.”   

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

"DOGVILLE"

Resultado de imagem para fotos Dogville - teatro
Mel Lisboa e elenco de "Dogville" Direção de Zé Henrique de Paula.

IDA VICENZIA
(Associação Internacional de Críticos de Teatro – AICT)
(Especial)
“DOGVILLE”
     Nos teatros do Shopping da Gávea está havendo uma unanimidade de pensamento em direção a um teatro mais sofisticado, mais racional. Ao menos tal novidade está presente em dois espaços cênicos: o do Teatro dos 4, com Harold Pinter em cartaz, e no Teatro Clara Nunes, com Lars von Trier. È sobre este último, o espetáculo de von Trier,  que vamos tratar aqui, porém, os mistérios do comportamento humano são discutidos, apaixonadamente, pelos dois autores nas duas peças citadas: “O Inoportuno”, de Harold Pinter, e “Dogville”, de Lars von Trier. Dessa vez, em se tratando de Trier, é colocada a questão filosófica do estoicismo, com a argumentação sobre a arrogância do bem. Para quem sempre procurou manter distância de von Trier, é uma surpresa ver a racionalidade do autor ao tratar o humano -  e outra surpresa ao ver sua aproximação do pensamento de Harold Pinter. 
     Através da primeira fala do personagem de von Trier - o narrador (talvez o próprio autor) - tomamos conhecimento que Dogville é uma pequena localidade, ideal para colocar uma lente de aumento no comportamento dos humanos. A utilização dessa lente nos garante uma proximidade quase promíscua com tal sociedade, e nada é melhor para a análise de um pequeno cosmos do que a promiscuidade. É diante dessa lente que o narrador procura a verdade - e é nesta busca da verdade que também se debate o espectador, nas quase duas horas de duração do espetáculo. O final da peça – aliás, instigante como todo o seu trajeto – o autor nos dá uma aula de como se prepara a “virada” para encerrar um acontecimento teatral. 
     Caso raro nos espetáculos atuais – excetuando os musicais – temos em cena 16 atores, sendo eles uma unanimidade em termos de interpretação. Identificamos alguns, os mais conhecidos e com participações artísticas destacadas, como Selma Egrei, Chris Couto, Bianca Byington, Fabio Assunção, Mel Lisboa. Mas também temos Anna Toledo, Blota Filho, Dudi Ejchel, Eric Lenate, Fernanda Couto, Gustavo Trestini, Marcelo Villas Boas, Fernanda Thurann, Munir Pedrosa, Rodrigo Caetano e Thalles Cabral.
     A historia é contada em capítulos, sendo o nono o final deles, e a chave para a procura filosófica do autor. As “portas” de Pinter se transformam, em von Trier, em “cortinas” a serem abertas. Através delas podemos descortinar a verdade. 
     Trata-se de um espetáculo desconcertante, no qual o poder do bicho homem se transforma em pesadelo. Destaca-se a atuação de Mel Lisboa. Entretanto, o elenco é tão coeso, e a mão do diretor – Zé Henrique de Paula – tão segura, que temos a sensação da novidade absoluta na atuação de todo o elenco: uma novidade em matéria de teatro, se desenrolando diante de nossos olhos. Há uma projeção que amplifica a expressão do ator, em closes cinematográficos. A impressão que temos é de que a ação está acontecendo no momento do acontecimento cênico (e talvez esteja). Como não conhecemos tais recursos, o espanto é total. Fernanda Thurann, que também está na peça como atriz, é uma das responsáveis pelo efeitos cinematográficos
     A Direção de Audiovisual é de Laerte Késsimos e a criação é do VJ Alexandre Gonzalez. Fotografia Ale Catan, e Produção Executiva de Jaliana Trimer. Felipe Lima, da Sevenx Produções Artísticas, se pergunta a respeito da reação dos moradores de Dogville, perante a demonstração de bondade absoluta de Grace (Mel Lisboa): “Como os moradores daquela cidade aparentemente tão simples e tão generosos poderiam ter cometido tantas atrocidades a uma forasteira que ofereceu-lhes apenas o que tinha de melhor?” 
         São os mistérios da alma humana, o seu medo, a sua mesquinhez!
     Com cenário de Bruno Anselmo e uma equipe cenográfica de fazer inveja a qualquer produção, temos a iluminação de Fran Barros conseguindo recursos jamais vistos em teatro, sua luz é uma mistura de pincel artístico e reações flu de cores esmaecidas, estabelecendo  novidade cênica. Os figurinos de João Pimenta possuem sofisticação descontraída, mostrando as possibilidades de movimento dos rústicos personagens. Há cores desmaiadas, em contraste com o marrom e o vinho do figurino da protagonista Mel Lisboa, atriz que retorna, em boa hora,  aos nossos palcos.
     “Dogville” é um espetáculo bem cuidado, em seus mínimos detalhes. A música de Fernanda Maia acentua, sem exageros, a dramaticidade da historia a ser contada. Produção musical de Leo Versolato. O visagismo de Wanderley Nunes é um dos responsáveis pela estranheza visual dos habitantes de Dogville. E, à propósito: há a presença sonora (e irrecusável...) da “espécie animal” que dá nome à cidadezinha. O Dog é o único ser normal, nesta historia!