Rogério Freitas (o corretor de imóveis) e Jorge Caetano (o crossdresser Sasha), em "A Porta da Frente", de Julia Spadaccini. |
IDA VICENZIA - CRÍTICA DE TEATRO
(da
Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)
Interessante essa encenação de um crossdresser, em "A
Porta da Frente", de Julia Spadaccini, atualmente em cartaz no Laura
Alvim. O destaque está bem no centro do palco, e na revolução que faz nas
cabeças. O crossdresser Sasha (interpretado por Jorge Caetano), é uma pessoa divertida, ética, que respeita e quer ser respeitado. Coisa intrigante, ele é o personagem
mais normal da peça.
Ao que parece, leciona canto. Ao menos é o que ele diz - e
mostra. Sua porta da frente está sempre aberta para entender e dar um pouco de
bom senso às pessoas. Sasha pode ser uma representação do andrógino do futuro.
E aí pensamos em Laerte, o quadrinista, aquele homem/mulher, sem perder a
masculinidade. Pensamos também "naqueles reis", como o Louis XV, másculo, bonitão,
e vestido como um crossdresser. Na verdade, esse personagem é atemporal.
Sasha se diverte com a reação de seus vizinhos, e aproveita
para dar um show com seus dotes de cantor. E argumenta, para o "vizinho estressado": "Você fala? Então pode cantar". Nem é preciso dizer que as
cenas de Sasha (Jorge Caetano), com o "vizinho estressado", o corretor de imóveis (Rogério Freitas)
são muito divertidas.
Julia Spadaccini é uma dramaturga brasileira que vai ficar
conhecida além fronteiras... Em "A Porta da Frente" ela faz uma velada homenagem a Tchecov. É uma de suas sutilezas. A autora é espontânea e acertada, na comedia e
na tragédia. "O Céu está
Vazio" e "Aos Domingos" (únicos assistidos por esta crítica), foram
o suficiente para chegar a essa sensação. Não que "O Céu está Vazio" seja
uma comedia, e "Aos Domingos" uma tragédia....Julia mexe com as
cabeças, faz pensar, e sabe como finalizar uma peça. A dupla Jorge Caetano e Spadaccini
está dando certo. Caetano também dirige, dessa vez em dupla com Marco André Nunes.
Temos ainda, no palco, a mãe neurótica e algo alienada, com possíveis amores
virtuais. Malu Valle está ótima. E há os adolescentes maluquinhos, e ainda por
cima gêmeos, interpretados por Felipe Hauit e Nina Reis. E a avó (Maria
Esmeralda Forte), a personagem que alimenta aquele tipo de mistério que a
velhice trás - surpreendendo com a sua
lucidez - ou enlouquecendo a todos com a
sua loucura. A peça é uma discussão séria travestida em comedia familiar.
Figurinos muito apropriados aos personagens, de Rui Cortez. O
cenário de Aurora de Campos dá a chave para uma aparente comedia de encontros e
desencontros - quase um boulevard moderno - para despistar o real desencontro estabelecido
pelo texto. A iluminação, bastante viva, é de Renato Machado; Direção de Movimento:
Márcia Rubin; Direção de Vídeo: Gustavo Gelmini; Trilha musical: Jorge Caetano
e Marco André Nunes; Direção Musical: Felipe Storino.