Nina Reis e Ricardo Kosovski em "Boa Noite, Professor", texto e direção de Julia Stockler e Lionel Fischer. (Foto Guga Melgar) |
IDA VICENZIA
(da Associação
Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)
"BOA
NOITE, PROFESSOR"
O espetáculo comemora os 65 anos do Teatro
Tablado, e trás o retorno das peças adultas ao espaço. Texto e direção de Julia
Stockler e Leonel Fischer.
Podemos classificar "Boa Noite,
Professor" como um representante fiel do teatro psicológico. Os dois
personagens, interpretados por Nina Reis e Ricardo Kosovski, aluna e professor,
buscam a verdade, devassando o que há de mais oculto em cada um de nós (em cada um deles).
Optamos
por uma analise baseada no padrão de comportamento
dos personagens, e seu desenvolvimento emocional. Jogamos com o fascínio do Mal,
trazido pela psicopatia... e com o
suspense... 'tempo' característico de "Boa Noite, Professor".
... E quais são as características do Mal?
A pergunta se coloca, buscando a compreensão do comportamento, ao mesmo tempo frágil
e agressivo, do Professor. A psicopatia não vê o "Outro"; não possui
empatia pela dor alheia; não ama; não reconhece a culpa. No caso do Professor,
o processo se coloca em nuances, talvez sendo a mais forte o "não
reconhecer a culpa".
Como autora que sou, sei como funciona o
"gatilho" para a criação. E percebo o "gatilho". Nesta
peça, ele pode surgir, de maneira inesperada. Há frases, entre os personagens, que
o sustentam. Há frases repetidas, algumas muito conhecidas no meio jornalístico,
como: "Isso acontece... isso acontece, é normal..." - tal como a
monótona repetição do Professor, no final da peça, quando ele relembra, patético, como matou a
mulher: "Ela pedia: aperta mais!... aperta mais..." Perfeito. Cena
perfeita: somos culpados pela nossa queda. O Mal, sem a consciência de se estar
praticando o mal. Há um jogo entre vitima e algoz.
Mas divago... se essa crítica não se engana -
e ela crê que não se engana - o embrião da visita da aluna, em "Boa Noite,
Professor", o "gatilho" da peça, surgiu da visita desesperada de
Ida Vicenzia, anos atrás, ao Tablado, querendo fazer "justiça". Repito:
para quem escreve, tal acontecimento inesperado pode ser o "gatilho"
para a criação. Essa cena aconteceu, em proporções menores, mas ficaram as
marcas. Finalmente, depois de "Boa Noite, Professor", ficamos reconciliados
com o passado, e podemos ver a 'humanidade' com novos olhos.
Na peça "Boa Noite, Professor", tudo
acontece em uma noite qualquer. Eis que surge, na sala de trabalho do professor
universitário, uma aluna. Ela quer "tirar algumas dúvidas". O
professor gosta de fotografia, a aluna também... e os elementos do
quebra-cabeça vão se juntado. O professor, em vias de se aposentar, não quer
mais se lembrar do passado. A aluna traz o "suspense erótico" para o
passado do diretor. Porém, ele se nega a ir ao encontro da armadilha... e a
trama, bem urdida, se desenvolve!
A aluna mostra as fotos de sua mãe, em uma
praia. Fotos tiradas pelo professor? O professor fica agitado e ordena que a
aluna se retire de sua sala. A reação da aluna surge, em uma tentativa de
sedução... (admirável o desempenho de Nina Reis, a sua maturidade artística). O
professor não cede à sedução, mas há algo que o atormenta, e ele só repete, ad nauseam: "Ela pedia: aperta mais!... aperta
mais..."
No teatro psicológico que se estabelece, a
aluna leva o professor aos meandros ocultos de sua consciência. O que aconteceu
naquela praia? O patético da cena final se afirma na confissão... e no silêncio
que se segue. O professor repete, incansavelmente: "Ela pedia: aperta mais!...
aperta mais..." a repetição,
exaustiva, da frase, seguida do silêncio. Ricardo Kosovski trás, para esta cena, a
sua verdade de ator.
Uma "arena no palco" (formação
dada ao 'espaço cênico' do Tablado), dá oportunidade ao público de se aproximar
do drama, e ser envolvido por ele. Há fortes interpretações, e a realidade
transborda. A direção busca a entrega total dos atores, e é muito bem sucedida
nesta busca. A ação, em suspense crescente, proporciona aos atores um
"despojamento do oculto", e temos aí um verdadeiro encontro com o
teatro!
Na ficha técnica, a alegria de quem
assiste teatro. "De Simoni", na luz.... "Tato Taborda" na
trilha sonora. No cenário: "José Dias". Direção de Produção: "Fernando
do Val". ... Ana Carolina Lopes nos
figurinos, Guga Melgar nas fotos... e o pessoal da casa, os montadores de luz:
Anderson Peixoto, André Ensá e Gabriel Prieto; Luisa Marques na bilheteria. Há,
no Tablado, um acolhimento "em família", algo que os teatros devem conservar...
Há um ambiente teatral, e o público sente-se bem, naquele ambiente.
ACONSELHA-SE VISITAR O TABLADO NESTE ANIVERSARIO DE 65 ANOS E ASSISTIR a
competente direção de Leonel Fischer e Julia Stockler, neste "Boa Noite,
Professor".
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