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terça-feira, 16 de agosto de 2016

"BOA NOITE, PROFESSOR"

Nina Reis e Ricardo Kosovski em "Boa Noite, Professor",
texto e direção de Julia Stockler e Lionel Fischer.
(Foto Guga Melgar) 

IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)

"BOA NOITE, PROFESSOR"

     O espetáculo comemora os 65 anos do Teatro Tablado, e trás o retorno das peças adultas ao espaço. Texto e direção de Julia Stockler e Leonel Fischer.

     Podemos classificar "Boa Noite, Professor" como um representante fiel do teatro psicológico. Os dois personagens, interpretados por Nina Reis e Ricardo Kosovski, aluna e professor, buscam a verdade, devassando o que há de mais oculto em cada um de nós (em cada um deles). 

     Optamos por uma analise baseada no  padrão de comportamento dos personagens, e seu desenvolvimento emocional. Jogamos com o fascínio do Mal,  trazido pela psicopatia... e com o suspense... 'tempo' característico de "Boa Noite, Professor".  

     ... E quais são as características do Mal? A pergunta se coloca, buscando a compreensão do comportamento, ao mesmo tempo frágil e agressivo, do Professor. A psicopatia não vê o "Outro"; não possui empatia pela dor alheia; não ama; não reconhece a culpa. No caso do Professor, o processo se coloca em nuances, talvez sendo a mais forte o "não reconhecer a culpa".

     Como autora que sou, sei como funciona o "gatilho" para a criação. E percebo o "gatilho". Nesta peça, ele pode surgir, de maneira inesperada. Há frases, entre os personagens, que o sustentam. Há frases repetidas, algumas muito conhecidas no meio jornalístico, como: "Isso acontece... isso acontece, é normal..." - tal como a monótona repetição do Professor, no final da peça,  quando ele relembra, patético, como matou a mulher: "Ela pedia: aperta mais!... aperta mais..." Perfeito. Cena perfeita: somos culpados pela nossa queda. O Mal, sem a consciência de se estar praticando o mal. Há um jogo entre  vitima e algoz.  

     Mas divago... se essa crítica não se engana - e ela crê que não se engana - o embrião da visita da aluna, em "Boa Noite, Professor", o "gatilho" da peça, surgiu da visita desesperada de Ida Vicenzia, anos atrás, ao Tablado, querendo fazer "justiça". Repito: para quem escreve, tal acontecimento inesperado pode ser o "gatilho" para a criação. Essa cena aconteceu, em proporções menores, mas ficaram as marcas. Finalmente, depois de "Boa Noite, Professor", ficamos reconciliados com o passado, e podemos ver a 'humanidade' com novos olhos.  

     Na peça "Boa Noite, Professor", tudo acontece em uma noite qualquer. Eis que surge, na sala de trabalho do professor universitário, uma aluna. Ela quer "tirar algumas dúvidas". O professor gosta de fotografia, a aluna também... e os elementos do quebra-cabeça vão se juntado. O professor, em vias de se aposentar, não quer mais se lembrar do passado. A aluna traz o "suspense erótico" para o passado do diretor. Porém, ele se nega a ir ao encontro da armadilha... e a trama, bem urdida, se desenvolve! 

     A aluna mostra as fotos de sua mãe, em uma praia. Fotos tiradas pelo professor? O professor fica agitado e ordena que a aluna se retire de sua sala. A reação da aluna surge, em uma tentativa de sedução... (admirável o desempenho de Nina Reis, a sua maturidade artística). O professor não cede à sedução, mas há algo que o atormenta, e ele só repete, ad nauseam:  "Ela pedia: aperta mais!... aperta mais..."

     No teatro psicológico que se estabelece, a aluna leva o professor aos meandros ocultos de sua consciência. O que aconteceu naquela praia? O patético da cena final se afirma na confissão... e no silêncio que se segue. O professor repete, incansavelmente: "Ela pedia: aperta mais!... aperta mais..." a  repetição, exaustiva, da frase, seguida do silêncio. Ricardo Kosovski trás, para esta cena, a sua verdade de ator.

     Uma "arena no palco" (formação dada ao 'espaço cênico' do Tablado), dá oportunidade ao público de se aproximar do drama, e ser envolvido por ele. Há fortes interpretações, e a realidade transborda. A direção busca a entrega total dos atores, e é muito bem sucedida nesta busca. A ação, em suspense crescente, proporciona aos atores um "despojamento do oculto", e temos aí um verdadeiro encontro com o teatro!

     Na ficha técnica, a alegria de quem assiste teatro. "De Simoni", na luz.... "Tato Taborda" na trilha sonora. No cenário: "José Dias". Direção de Produção: "Fernando do Val".  ... Ana Carolina Lopes nos figurinos, Guga Melgar nas fotos... e o pessoal da casa, os montadores de luz: Anderson Peixoto, André Ensá e Gabriel Prieto; Luisa Marques na bilheteria. Há, no Tablado, um acolhimento "em família", algo que os teatros devem conservar... Há um ambiente teatral, e o público sente-se bem, naquele ambiente. ACONSELHA-SE VISITAR O TABLADO NESTE ANIVERSARIO DE 65 ANOS E ASSISTIR a competente direção de Leonel Fischer e Julia Stockler, neste "Boa Noite, Professor".          
               

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