Luciana Fávero (D. Marta Rola) e Claudio Tovar (Juiz Adão) em "A Moringa Quebrada" (Foto de Antonio Garcia) |
IDA VICENZIA FLORES - CRITICA DE
TEATRO
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)
A peça de Heinrich von Kleist, "A
Moringa Quebrada", estreou no
Espaço NET, sala Paulo Pontes, com direção de Gustavo Paso. Em destaque: a volta
aos palcos de Claudio Tovar. A farsa de von Kleist sobre as leis, vista por uma
comunidade de camponeses alemães do século XIX, é transposta para os palcos
brasileiros através de uma encenação no sertão nordestino (adaptação de Gustavo
Paso), com tradução de Marcelo Backes.
O Nordeste, seus costumes e a maneira de
processá-los, poderia ser um recurso marcante (ambiciona o tom de farsa de
Ariano Suassuna), não fosse o descompasso entre os atores: há, entre eles,
profissionais de renome dando apoio a um grupo semi-amador. Calma! Essa
observação justifica-se pela impostação de voz de alguns atores da Cia Teatro
Epigenia, desconcentrando o público especializado e com isso diminuindo a
probabilidade de acerto de ideia tão profícua. Embora a montagem se inspire na Literatura
de Cordel, nada desculpa a falha vocal dos atores que interpretam o Escrivão Luz (Thiago
Detofol); Robério Cacimba (Felipe Miguel) e Margarida (Talita Vaz), papéis
fundamentais no decorrer da trama. Aliás, em se tratando dessa adaptação da
obra de Kleist (já vi outras), todos os papéis tornam-se fundamentais. Os
atores Samir Murad (Conselheiro Magno), Luciana Fávero (D. Marta Rola); Barbara
Werlang (Eva Rola); Antonio Barboza (Vito Cacimba), e principalmente Mônica
Vilela (Sra. Roupapreta), salvam a montagem com suas atuações. E, principalmente, Claudio Tovar, em
magnífica interpretação do Juiz Adão (diga-se que a adaptação dos "ditos e
maneirismos do Nordeste", feito por Gustavo Paso alimentou as falas desse
ator). O lascivo Juiz alcança sutilezas que despertam um sorriso cúmplice em
quem o assiste, principalmente nos momentos em que percebe que é o alvo das
suspeitas do Conselheiro Magno (Samir Murad corresponde ao solicitado, em um
papel cheio de nuances).
O alucinado "Adão" tenta
corromper a fiel "Eva", através de expedientes espúrios. A descoberta
de sua "vilaneza" é o ponto alto do espetáculo. Não conseguimos
desviar os olhos de Claudio Tovar, quando está em cena (e sempre o está). Tanto
a sua expressão corporal, quanto a vocal, são impecáveis. O olhar, a desfaçatez
e o espanto do Juiz Adão fazem reviver o grande personagem criado por Kleist. Esse
papel já deu prêmio a atores nacionais, como o gaúcho Claudio Heeman, em 1961.
O mundo é dos Claudios! E, segundo a lenda, dos diabos! Não há nada mais
fascinante do que relembrar o papel do "pé de cabra" nas brenhas
nordestinas. Neste sentido é marcante a participação de Mônica Vilela, como a
Sra. Roupapreta, a caçadora de diabos!
A versão brasileira de Heinrich von Kleist,
criada por Gustavo Paso, nos leva a um Brasil arcaico, não muito longe da
Alemanha recém saída da Idade Média, ilustrada pelo dramaturgo. O enfoque dado pelo
diretor busca uma aproximação com o Brasil atual (corrupção, etc), mas fica
somente no seu simulacro de um país "exótico". Ainda bem, simulacro, pois
o que precisamos agora é justamente nos livrar da imagem do "exótico"
que carregamos, e também a do país de corruptos.
O
local fictício da ação é em "Upa Cavalo" - um "sub-reino da
Monarquia Parlamentarista dos Estados Federativos do Brasil" e, se tal local
não existe, fica-se sempre livre de qualquer semelhança com os acontecimentos nacionais,
embora o teatro seja uma lente de aumento nada ingênua. Mas que acontecimentos
são esses, afinal? Um juiz corrupto, que não se importa com sua função e vive
em um local onde não há nem Deus nem Lei, e tudo acontece conforme a sua gana e
o seu descaso. Será essa a imagem do Brasil que queremos?
Ficha
técnica: Direção: Gustavo Paso; Assistência de Direção: Suzana Castelo; Adaptação:
Marcelo Backes; Pesquisa popular, de ditos e maneirismo do Nordeste: Gustavo
Passo; Cenário: Gustavo Paso e Teca Fischinski; Figurinos: Teca Fichinski (um
caótico deliberado); Preparação Vocal: Dody (sua atuação pode ser aprimorada);
Pesquisa Corporal Édio Nunes. Trilha Sonora (a desejar), de Luciana Fávero e
Felipe Miguel; Letra de "Eu Quero" (com encenação final de despedida,
em tom animado, cativante, trazendo à vida, inesperadamente, a filosofia de von
Kleist!), de Gustavo Paso e Luciana Fávero. Assessoria de
Imprensa, Ney Motta.
Muito obrigado pelo seu retorno tão rápido. É sempre importante a visão do crítico, principalmente a sua, que respeito tanto!
ResponderExcluirMuito obrigado, vamos rever os pontos de dicção, que em alguns pontos já estavam sendo identificados.
No mais, estou investindo em gente nova... a nova formação da CiaTeatro Epigenia.
bjs
Gustavo Paso
Gostei de sentir que o Gustavo Paso viu em sua crítica o olhar amoroso de quem respeita e ama o teatro. Vou esperar um pouquinho e me programar para ver. Beijos.
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