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quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

"NEY MATOGROSSO"

Ney Matogrosso em "Beijo Bandido", despedida da turnê, Rio de Janeiro, Theatro NET, dia 12 de dezembro de 2012.
(Foto Divulgação)

CRITICA TEATRAL
“BEIJO BANDIDO”
NEY MATOGROSSO
(MÚSICA E TEATRO)
IDA VICENZIA FLORES
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro – AICT)
(Especial)

Ontem, dia 12 de dezembro, foi a despedida de Ney Matogrosso, no Theatro NET, Rio de Janeiro. “Beijo Bandido” em excursão nas principais capitais do país,  nestes últimos 4 anos,  volta ao Rio para se despedir em grande estilo. Iniciado, em setembro de 2009, esse show camerata mostra o cantor-ator em sua essência. Ele ama a plateia, faz amor com a plateia, e lança um desafio a ela: “não pense que você me tem”, em sua música encantadora de serpentes.
     William Burroughs, o mestre hippie diz: “fui escalado para o papel de Guardião, para criar e alimentar uma criatura que é parte gato, parte humana e parte algo ainda inimaginável, que pode resultar de uma união que não acontece há milhões de anos”.  Está enganado, o mestre. Essa união “que não acontece há milhões de anos” está acontecendo agora, e se concretizou em Ney Matogrosso. Leão, felino, gato. Seu refrão poderia ser “Há um felino dentro de mim” – como na canção de Rita Lee (não é à toa que ele nasceu no dia 1º de agosto). Porém, essa constatação poderia ser muito óbvia, posto que todos sabem que Ney Matogrosso é um felino. Mas não é tão óbvia assim.
      Em “Beijo Bandido”, dessa vez, Ney retornou à música introspectiva, deixando o tom “extrovertido” de seus shows mais conhecidos. Aliás, desde 1978, com “Pescador de Pérolas”, que Ney vem alternando apresentações clássicas, em que a linda tessitura  de sua voz de contratenor (o equivalente ao contralto, na mulher) é apropriada para esse tipo de apresentação e é também uma característica de sua  personalidade. Neste clássico “Beijo Bandido” ele volta a vestir “discretamente” terno e gravata (criação de Orsimar Versolato), embora essa gravata mais pareça um lenço de pirata. O cenário é em tule de filó preto, e tem uma projeção, ao fundo, com Ney reproduzindo a sua imagem, ao cantar. Perdoem-me, pois não consegui saber de quem é o cenário. É interessante. Mais tarde acrescentarei. Esse é o “no stress” do blog.
     Tanto o repertório de Ney, quanto os músicos que o acompanham, exibem um jeito intimista, “camerístico”, de ser, e de fazer música, embora alguns requebros, sua marca registrada, surjam. O público demonstra que tem paixão por esse cantor versátil e inteligente que é Ney Matogrosso. Para alguns, que o conhecem desde os tempos de hippie em Santa Teresa, o amor que desperta é uma constatação. Para outros, que o acompanham desde os tempos dos Secos & Molhados - e outros ainda, que leem as suas entrevistas, todos eles sabem que Ney é um artista coerente com suas ideias. Para as mulheres, em particular, ele abre um novo caminho, o da androginia, cortando a barreira entre feminino e masculino, o que as encanta.
     Quanto à sua atuação no palco, Ney leva a plateia à loucura. Neste “Beijo Bandido”, desde seu começo, quando canta “Tango para Teresa” (de Evaldo Gouveia e Jair Amorim), até o momento em que tira o casaco de forro vermelho e, qual um toureiro com sua capa, começa a “tourear” o público (veja a foto), essa fera, ainda contida, às vezes inspira ternura (!) com seu sorriso de menino, ou nos ameaça com um olhar severo,  que remete aos tempos de “Sangue Latino”. Ops! Lá pela quarta música, eis que surge “Invento”, de Vitor Ramil, a razão de ser do título do show, o beijo bandido. É tudo teatro, e do mais  puro. Aliás, ser ator foi o seu primeiro movimento, e ele o concretiza no palco com os shows, e agora também no cinema, onde faz o maior sucesso em “Luz nas Trevas – A Volta do Bandido da Luz Vermelha” (argumento de Rogério Esganzerla, direção de Helena Ignez), onde canta o memorável “Sangue Latino”, autoria de João Ricardo (o produtor/cantor que o convidou para participar do Secos & Molhados), e Paulinho Mendonça.   
     Na despedida da turnê “Beijo Bandido”, no Rio de janeiro, Ney Matogrosso é acompanhado por Leandro Braga (que também é o diretor musical e arranjador), ao piano; Alexandre Casado (violino e bandolim); Felipe Roseno (percussão); Lui Coimbra (violoncelo e violão). A música que mais empolga o público (pelo menos no último dia) é “Bicho de Sete Cabeças”, de Zé Ramalho, Geraldo Azevedo, Renato Rocha. Tem também “Mulher sem razão”, de Cazuza, Bebel Gilberto e Dé Palmeira).
     Mas o público também vem abaixo quando Ney canta - aliás, todas, mas, e principalmente: “Segredo”, de Herivelto Martins e Marino Pinto; “Medo de Amar”, de Vinicius de Moraes; e  “Fascinação”, canção francesa tantas vezes traduzida. Ney cantou a tradução clássica de Armando Louzada, segunda parte, e esse foi um momento de intensa emoção: “Os sonhos mais lindos sonhei/ de quimeras mil um castelo ergui/ E no teu olhar/ Tonto de emoção/ com sofreguidão/ mil venturas previ!” música original de Maurice Féraudy e Dante Pilade. Ouve-se gritos de “gostoso”, e assobios, e palmas demoradas a cada música.  O show se encerra com “Fala”, de João Ricardo e Secos & Molhados): “Eu não sei dizer/ Nada por dizer/ Então eu escuto...//.
     Ney Matogrosso vai continuar alternando introspecção e extroversão, na linha de seus shows. O anterior, “Inclassificáveis”, teve um repertório de rock. Esse “Beijo Bandido” é intimista, e o próximo será... ? Aguardemos! Andei vasculhando e descobri que o próximo show será de rock, com uma banda chamada “Zabomba”; um compositor chamado Vitor Pirralho, e outros ainda, inclusive um chamado Tono. Gente nova. Um novo encontro marcado com Ney Matogrosso. Falando em Ney, esse ator/cantor já tem mais dois filmes engatilhados, prontos para serem exibidos. Ele não para: é que nem o “tempo”, na música de Cazuza. Só que Ney desmoralizou o “tempo”. Que efebo é esse?  Vem uma nova cronologia por aí.   

3 comentários:

  1. Há tempos não vejo um show de Ney Matogrosso, o que é uma pena porque ele é realmente especial. Que bom que você viu e comentou. Vou mostrar sua crítica ao meu amigo Rodrigo Faour, que o dirigiu em um show recente com a Marília Bessy. Beijos.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Ah, eu vi os dois shows com a Marília Bessy. Vi Beijo Bandido 15 vezes. E o Inclassificáveis, 15 vezes também!!! Além de fã, sou fotógrafa... E Ney é uma delícia de se fotografar. Adorei tua crítica, endosso cada palavra. Esse felino atemporal é realmente cativante! E como canta... como interpreta... Eu gostava dele como de outros cantores, mas quando fui conhecendo mais a fundo seu trabalho, ele me conquistou. Já estou me preparando para a próxima turnê.

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