Jan Macedo, Leo, em "Cabeça de Vento", autoria e direção Cleiton Echeveste (foto Cristina Froment) |
CRÍTICA TEATRAL
IDA VICENZIA
FLORES
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)
Até dia 5 de maio, todo sábado e
domingo às 16h, crianças e adultos têm um bom pretexto para irem ao Teatro
Dulcina, ali, na Rua Alcindo Guanabara, Centro. Trata-se de "Cabeça de
Vento", escrito e dirigido por Cleiton Echeveste. A peça é para crianças, mas,
creiam, é teatro para todas as idades!
Essa "chamada" serve para
localizar uma história poética. "Cabeça de Vento", apelido carinhoso
que a mãe de Leo, o protagonista, dá ao filho, é um relato que privilegia o encontro
entre a emoção e o saber. O que está em jogo é o contato do menino Leo (Jan Macedo, ótimo) com a vida. Esse contato se dá através do olhar profundamente
poético do autor. A narrativa tem início com o cotidiano do menino, do relacionamento
afetivo de Leo com seus pais. São relatos divertidos e, às vezes. Pungentes. Como
o da ausência do pai - mas sempre teatrais, lúdicos. Nas cenas vão surgindo os
primeiros jogos, as primeiras teimosias, as primeiras leituras. E são essas leituras
que vão determinar os acontecimentos. O relato se debruça sobre a ausência do pai, sendo as
brincadeiras com a "pandorga" (a
pipa carioca), a ligação lúdica entre
pai e filho. A pipa será o fio condutor da ação, mas o que a transforma são os
encontros fictícios entre Leo e os grandes personagens da História.
Leo gosta de ler. Desenvolveu este prazer
através do presente que ganhou de sua mãe, um livro que pertencia a seus
antepassados: um livro de História Universal. O menino passa a dividir a sua
vida entre o prazer da leitura, a escola, e as brincadeiras com sua pipa. É
quando ela desaparece entre o bambuzal, que a história verdadeira começa: em
sua procura, o que Leo encontra são os personagens da História! Essa é a
dinâmica da narrativa. A cada um dos personagens o autor dá a visão histórica correspondente,
acrescida de sua própria visão: Benjamin Franklin (Eduardo Alomeida) é o distraído inventor
que tem forte ligação com o movimento dos ventos. O menino se identifica com
ele. A "generala" chinesa Fu Hao, também sacerdotisa (Luciana Zule),
e por último o hilariante "Cruzado" Ricardo Coração de Leão, Rei da
Inglaterra (Eduardo Almeida).
A cada um desses personagens históricos o
autor enfeita com sua visão pessoal. Podemos dizer que a ênfase que Echeveste dá
ao Rei da Inglaterra é, talvez, a mais ilustrativa dos personagens (o ator Eduardo Almeida alterna o papel do pai, de Benjamin Franklin e de Ricardo Coração de
Leão, enquanto Luciana Zule, mãe e generala Fu Hao, ambos perfeitos).
Falando em atores, o elenco dá uma dinâmica especial ao texto, através de
primoroso desempenho. Eduardo faz uma
crítica hilariante, ao interpretar Ricardo Coração de Leão seu furor a lutar
com muçulmanos pela conquista de Jerusalém. A insensatez humana está muito bem
representada neste personagem. O menino Leo chega a ficar escandalizado com o furor
e o sotaque francês do Rei, e pergunta-lhe a causa.
São acenos
do autor para despertar o interesse da jovem platéia por informações históricas. E este espetáculo
é um importante elo cultural teatro/educação, aproveitado com a presença, na platéia,
de escolas convidadas. O interesse dos alunos por História pode surgir, expandindo-se
para outros domínios culturais. No episódio do rei inglês o autor chega a citar Saladino, o bravo guerreiro
muçulmano pouco conhecido entre nós. Nestes termos, "Cabeça de Vento"
é uma surpresa, ao combinar importantes
momentos culturais com uma terna convivência familiar do menino com seus pais.
Espera-se que cada um dos espectadores desfrute o espetáculo com o conhecimento
que possui, e desenvolva uma visão crítica da História, incluindo a nossa.
Pois
o autor não deixou de lado o outro aspecto da História: a nossa. Percebe-se, na
narrativa, o tratamento dado à região natal
de Echeveste, o Sul do pais. O autor é gaúcho, e é através da paisagem estabelecida no cenário, e,
principalmente do figurino do pai (Eduardo Almedia), que ele acena para sua terra
natal. É uma citação comovente. Também o bambuzal é um suporte característico
da região, e um bom recurso utilizado pela cenógrafa (Danielle Geammal), além
das pandorgas, é claro. As cenas vão se estruturando através da mobilidade dos canteiros de bambu, transformando-se em
floresta, em quarto de dormir, sala, e assim por diante, estabelecendo a dinâmica
da ação (Danielle Geammal é responsável por cenário e figurino). Os atores fazem a manipulação do
cenário, e nada fica forçado ou fora do contexto. Trata-se de uma dinâmica
positiva.
Em
resumo, essa procura das raízes, as lembranças do passado, os jogos educativos
e os personagens históricos tornam a experiência de assistir "Cabeça de
Vento" um acontecimento marcante. O carinho e a inteligência desse projeto,
sua temática cultural falam por si. Na
ficha técnica temos, além dos citados acima: Gustavo Finkler, na trilha sonora
e sonoplastia; iluminação Thiago Mantovani; preparação corporal, Fernanda Guimarães;
assessoria pedagógica, Janine Hofmaister; preparação vocal, Dani Calazans; assessora de
king fu, Lucilene Pessanha; identidade visual, Arthur Screinert; assessoria de
imprensa, Mônica Riani.
Ainda não vi Cabeça de Vento, mas, pelo histórico da Cia Pandorga de Teatro, há de ser um espetáculo de qualidade!!! Por esta crítica e pelos relatos do face, o autor Cleiton Echeveste e toda a equipe devem estar muito orgulhosos!! Que a Pandorga suba cada vez mais!! Vamos dar linha à pipa!! Um bj, Marizabel Pacheco
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