Espetáculo "Nordestinos", direção Tuca Andrada, texto Walter Daguerre, inspiração de Alexandre Lino. Cena com os "painéis de fuxico". (Foto Janderson Pires) |
IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de
Críticos de Teatro – AICT)
(Especial)
NORDESTINOS
Atualmente temos, no Rio de Janeiro, um criador-inspirador de textos
dramáticos de grande originalidade. O nome dele é Alexandre Lino. Primeiro
surpreendeu-nos com “Nordestinos”, e agora estreia com outro texto por ele
imaginado: “Volúpia da Cegueira”, primeira
direção de Lino, que promete ser de grande interesse para a plateia amante de
teatro. Alexandre limita-se a imaginar seus temas, convidando dramaturgos para
dar-lhes o tratamento final... até o dia em que, ele próprio, se reconheça
dramaturgo – e esse dia não vai tardar. Tive a alegria de assistir, há poucos
dias, já se despedindo do Rio de Janeiro e do Teatro Eva Herz, “Nordestinos”, texto de Walter Daguerre,
criação de Alexandre Lino e direção de Tuca Andrada. Chamara-me a atenção, a
peça, por ocasião de sua estreia, no Teatro do SESI/RJ, mas compromissos
impediram-me a presença. “Nordestinos” tomou-nos de surpresa, e escrever sobre ele
é imprescindível.
O que leva um ser humano a reconhecer-se
artista? Há vários caminhos, e o de Alexandre Lino é marcante: em seu “relato
documental” transformado em dramaturgia por Daguerre, Alexandre surpreende-nos
com a inesperada tomada de consciência de sua vocação. Descontente com a
experiência de trabalho no Rio de Janeiro, ouviu o conselho do irmão que, por
considerá-lo tímido, receitou-lhe “um curso de teatro”. Foi o suficiente para o
pernambucano Lino se reconhecer (e ser reconhecido) como ator!
Após essa brilhante
descoberta, Alexandre Lino criou uma Companhia de Teatro, dedicada ao ‘Teatro
Documentario’. “Nordestinos” é a sua quarta experiência no gênero, e a sua
atual “Documental Cia.” nos brinda com várias outras escolhas bem sucedidas. O espetáculo a que me refiro se inicia com uma
demonstração de teatro de mamulengos indicando o caminho que vamos seguir, nós,
o público. Ideia excelente, que introduz a plateia em um mundo muito
particular. E, mais interessante ainda, o seu idealizador insere no espetáculo
um ‘glossário’ para explicar o mundo e as palavras daquele “país-região”: o
Nordeste. Diga-se de passagem (e todos nós o sabemos), o nosso país-continente possui,
em cada região, uma maneira peculiar de falar. Assim, somos confrontados com
uma divertida brincadeira de reconhecimento de nossas diferenças. Um achado.
O idealizador do espetáculo também
participa do elenco, ou participava... pois agora esstá envolvido com “Volúpia
da Cegueira”, e não o assistimos em “Nordestinos”. Essa peça segue em apresentação no Rio e depois viaja por diversas cidades brasileiras. A direção,
precisa e divertida, é de Tuca Andrada, um mestre em espetáculos dessa
categoria: comédia inteligente! Vamos ao espetáculo. Antes, porém, uma
observação: o dia em que o assistimos, “Alexandre”, um dos personagens, era
interpretado pelo ator Murilo Sampaio, em ótima interpretação do ‘alter ego’ de
Alexandre Lino.
A historia é contada em
episódios, desenvolvidos graças ao expediente criado pelo seu idealizador, que
solicitou cartas de nordestinos radicados no Sul (Rio de Janeiro e São Paulo),
contando as suas aventuras na região. O assunto foi tanto que rendeu um livro,
editado pela Giostri, e um documentario que está sendo filmado para ser
apresentado ao público nordestino, em noite de convite especial.
São quatro atores contando as
aventuras que todos nós conhecemos,
historias do Nordeste e o confronto com o Sul. Mas há um novo olhar
sobre a questão, e estamos bem longe de tudo o que nos contou João Cabral de Melo
Neto em “Morte e Vida Severina”. É bem melhor assim, pois o que assistimos foi
uma historia contada, com altos e baixos, mas muita alegria. Os personagens nos
relembram, comunicando-nos: “poderiamos ter montado Saussuna, ou Nelson
Rodrigues” (que também são pernambucanos, como Lino!), mas resolveram trilhar o próprio
caminho. Excelente ideia. O elenco, formado pelo cearense Paulo Roque, a
paraibana Rose Germano, e a pernambucana Erlene Melo, salvo engano, já nossa
conhecida da peça “Domésticas”, e Murilo
Sampaio, um advogado-ator, que está substituindo Alexandre Lino. O olhar alegre
(e digno), que eles nos transmitem, é um fator de encantamento. São pequenos
episódios, rimados pela musica de Alexandre Elias, encarregado desse acerto
musical que é a historia da musica do Nordeste. Há despedidas, à la Caetano Veloso , sim, mas breve
e passageira, como são as canções da esperança de tempos melhores. E Alexandre
Elias acertou.
A iluminação de Renato Machado
- como sempre - é um espetáculo à parte. Iluminador de grande sensibilidade, ele
nos brinda, em um dado momento do espetáculo, com “silhuetas” refletindo a ação
dos personagens. Karlla De Lucca, cenógrafa e figurinista, prepara o palco para
a “tela de painéis”, nos quais se reproduz a cena das silhuetas e a dos bonecos
de mamulengos, e onde se refletem os desenhos dos “bordados de fuxico” - uma
citação à arte pernambucana. A elaboração dos figurinos, feita por Karlla, são simples
reproduções do cotidiano nordestino. Trata-se de um trabalho que flui, com
perfeição. O movimento dos atores e a preparação corporal está a cargo de Paula
Feitosa. É um prazeer vê-la de volta aos palcos: seu trabalho com os atores é
digno dos melhores aplausos. A ficha técnica é um acerto só. Assistência de
Direção e Dramaturgia: Fabricio Branco. NÃO PERCAM “NORDESTINOS”! AINDA HÁ
TEMPO PARA CONFERIR.
Nenhum comentário:
Postar um comentário