Vaz, Babaioff e o olhar de Ecard em "Tom na fazenda", direção Rodrigo Portella (foto divulgação) |
IDA
VICENZIA
(da
Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)
Eis uma peça de teatro difícil de julgar,
porque apresenta uma mistura de situações - diria estilos - que não se
enquadram na convencional maneira de analisar texto e interpretação. Trata-se
de um drama? De uma tragédia? De uma tragicomédia? O único que sabemos sobre
ela é que dá ocasião (enorme) para
quatro atores mostrarem sua capacidade de atuação.
Algum crítico menos prevenido poderia
considerá-la pós-moderna (?) pelo fato de envolver tantas linguagens cênicas?
Ou talvez um drama moderno no estilo dos norte-americanos Eugene O'Neill,
Tennessee Williams e outros tantos? Fica a questão. O fato é que ultimamente o
teatro moderno tem dado passos inacreditáveis em direção ao horror. Passemos a
essa historia de horror. Insisto: comedia?
Eis o tema: sofisticação/em confronto com
primitivismo. Bons sentimentos/em confronto com desconsideração pelo próximo.
Enfim, o texto apresenta... o que uma boa educação católica condena! Pois é. Escrito
por um canadense da região do Quebec, portanto, de ascendência francesa, onde
se misturam bons celtas, e não menos ótimos latinos. Vá entender! Ou talvez
seja por isso mesmo que a confusão se estabelece. Com pitadas da "idiotia
rural" de Marx! O tema é a selvageria, e está preparada a sopa. Vamos a ela.
O nome do autor é Michel Marc Bouchard. Seu
texto ultrapassa os de Bernard-Marie Koltés, outro autor que atrai (no bom
sentido) a juventude - ou os não tão jovens assim - de hoje. Amo Koltés. Pois
bem, digamos que Bouchard não possui tanta sutileza assim, o que se propõe fica
escancarado. Ah! Se fica!
A começar por Kelzy Ecard, a nossa Bette
Davis moderna (o olhar!), que já começa mostrando a vida miserável a que o ambiente rural a
levou! Seu personagem, nada fácil, escancara os preconceitos e a má vontade que
podem se estabelecer em um ser humano levado a viver sem perspectivas. Enfim,
outra interpretação magistral de nossa querida Kelzy.
Em matéria de atrizes a peça está bem provida.
Há uma comediante nata, Camila Nhary, que possui um inglês cachorral e se sai
muito bem na confusão reinante. Claro, e "quem parte e reparte fica com a
melhor parte, ou é bobo..." etc, etc... os homens botam pra quebrar! Só
dá eles! Armando Babaioff (nunca o tinha visto em cena, surpresa), é o
idealizador do projeto, o tradutor da peça e um dos personagens centrais.
Realiza, com perfeição, os papeis que se atribuiu. Parabéns. (Ele interpreta
Tom, o sensível e urbano Tom).
Em contraponto temos o irmão de seu
namorado morto, interpretado por Gustavo Vaz, em papel tão selvagem quanto se
imagina ser a vida na roça. Ou pior. A fazenda está matando aquele homem.
Talvez, desde Marlon Brando, em "A Street Car...", tenha visto tanta
selvageria. Não, Vaz é mais selvagem ainda.
Enfim, sobrevivemos todos a tanto
primitivismo. Em matéria de teatro e desempenho dos atores - Nota 10.
FICHA
TÉCNICA: Além do já citado tradutor e ator, temos: Direção: Rodrigo Portella
(outro que tenho ouvido falar muito, e que fico devendo presença). Como
diretor, penso que Rodrigo é uma grande aquisição para o nosso teatro.
Cenografia da sensível Aurora dos Campos, que consegue transformar o palco em
um circo de horrores, auxiliada pela iluminação de Tomas Ribas (destaque para Babaioff/Tom
encerrado em um portamalas de carro!). Figurino contemporâneo de Bruno
Perlatto. Direção Musical Marcelo H com guitarras e violão, acompanhado por Jr.
Tostoi. Preparação Corporal Lu Brites (não a conhecia. Excelente!).
Coreografia: Toni Rodrigues.
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