"rINOCERONTEs", espetáculo do Coletivo Errante. Direção: Luiza Rangel. Orientação: Leonora Fabião. (Foto Maria Barillo) |
IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos
de Teatro – AICT)
(Especial)
Antonio Abujamra costumava dizer que
Ionesco é um autor que tem como objetivo o riso levado a sério. Quanto a mim,
não sei se ele tem qualquer objetivo (parece-me que, se o tem, é alertar para o
ridículo da sociedade humana), mas não se pode negar que ele é um criador empolgante.
Agora, por exemplo, temos esse rINOCERONTEs, encenado por um grupo chamado
Coletivo Errante, que nos joga na cara o impacto desse romeno maluco. E COMO É BOM ASSISTÍ-LO! O Coletivo tem a
percepção de jogar um hino brasileiro absolutamente surreal, o parnasiano de
palavras em desuso... como o nosso Brasil!: “Deitado eternamente em berço
esplendido”. De quem é a letra, mesmo? Duque Estrada! Esse hino é o nosso, o
Nacional! Precisamos acordar deste sonho em decomposição, deste pesadelo!
Mas não é só o nosso Hino que nos faz
entrar em nonsense! O que significam, por exemplo, aqueles animais,
os rinocerontezinhos verdes, de unicórnio (ou serão cornos duplos?) que se
estabelecem, de repente, entre os humanos? Muitos gostariam de ser um deles, e
segui-los, emitindo os mesmos sons e requebrando em seu paquidérmico andar.
E essa brincadeira gostosa deve ser
seguida pelo público que, de repente, cai em si: “Mas como? Está todo mundo
abandonando o barco? Indo para o meio da floresta? Andando na mesma manada?”
Muito a propósito a lembrança de montar Ionesco. Aliás, o grupo também é muito
bom. Se o romeno percebeu o absurdo que nos cerca, os atores do Coletivo
Errante fazem tudo muito melhor do que os franceses já fizeram, porque eles vão
se jogando, se desmantelando, junto com o cenário, no que deve ser, mesmo, o
fim de tudo. Somente um homem consegue não aderir a loucura geral, e permanece
consciente, apostando para ver o que vai acontecer, pois, afinal, ele é um
homem e não um animal!
Não tenho intimidade com rinocerontes.
Somente os vejo, com seu olhar ausente, em zoológicos, e me parece um animal
bem desprotegido, apesar de sua carcaça pré-histórica! Eles me causam pena. Mas
isso tudo não tem importância, perto do que está acontecendo, realmente, pois,
ao que parece eles soltos são muito perigosos.... Sim, precisamos de uma reação
determinada para não ficarmos tentados a seguir a manada destruidora de sonhos.
Mas já que estamos examinando uma peça de
teatro onde os acontecimentos nos enchem de estupefação, podemos observar que o
trabalho destes talentosos atores, dirigidos por um dos membros do Coletivo
(pelo que entendi, eles conseguiram romper as regras da hierarquia teatral, e
fazer um rodízio de funções, em um jogo que há muito tempo deveria estar em
ação). No caso, Luiza Rangel está na direção, e se desincumbe muito bem de suas
funções.
Trata-se de um grupo premiado que se
coloca à disposição do público, para tomarmos conhecimento de sue existência. O
que podemos dizer é que estamos surpresos com o desempenho deste Coletivo. Os
atores, os recursos cênicos, sonoros, coreográficos, são da maior competência.
Espero não perdê-los de vista. Certamente estes oito atores que compõe o
Coletivo Errante (o nome já é uma definição de seu trabalho), vão nos manter
sempre atentos para as suas iniciativas. Parabéns a Eleonora Fabião por
orientar essa turma! E a cenógrafa é de uma imaginação excitante. Seu nome?
Fabiana Mimura. Mas, com certeza, o grupo deve ter cooperado para as boas
soluções que o espetáculo consegue com tão pouco. Renato Machado está na
orientação deste pessoal. Parabéns para vocês todos. Aconselho ao público que
não perca rINOCERONTEs. Ele vai somente até o dia 3 de junho, no Teatro
Dulcina.
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