João Velho e elenco de "Realismo", texto de Anthony Neilson (foto cartaz divulgação) |
CRÍTICA
TEATRAL
IDA
VICENZIA FLORES
(da
Associação Internacional de Críticos de Teatro – AICT)
(Especial)
“Realismo”, peça
de Anthony Neilson, direção de Tato Consorti, em cartaz até o dia 31 de março
na Justiça Federal da Av. Rio Branco/RJ,
é
um exercício de atenção, timming e “destreza moral” contemporânea, tanto para o
elenco quanto para a platéia. Em pouco mais de uma hora, o pequeno apartamento
de João Velho, o protagonista, serve às intenções do autor, e todas as
abordagens (ou quase todas), as abordagens do mundo moderno se fazem presente.
Não se sabe o que o protagonista João Velho (o mesmo nome do ator), quer fazer
naquele sábado, a não ser ficar sozinho.
Sem chance. Tempos e personagens vão reafirmando uma convivência, pouco
provável, entre passado e presente. É quando mãe, namoradas, pai e amigo se encontram,
alternando-se em situações aparentemente aleatórias, porém que vão construindo
o texto. Aí percebemos, em cena, elementos do teatro contemporâneo, e suas
aventuras de linguagem. É quando o público vai armando o quebra cabeça do que é
representado. E é quando realidade e fantasia se fazem presentes, na cabeça de
João Velho, o protagonista, intercalando vida e lembranças.
A cobrança dessas
lembranças se impõe e, finalmente, o amor maduro cobra e determina o presente. Tudo acompanhado
por um gato sestroso, uma máquina de lavar que fala, e a crítica voraz à
propaganda invasiva, através de uma
conversa ao telefone. Na encenação há
flashes onde o misticismo convive com a traição (cenas altamente irônicas); onde
amizade e amor convivem com hipocrisia e inveja. Porém, no emaranhado dessas situações, eis que surge um realismo
controvertido. Onde o realismo? Podemos
imputá-lo, e tão somente, às atitudes do cotidiano do protagonista lavando
roupa, preocupando-se em comer, ir ao banheiro, ver TV, posicionar-se
politicamente, fazer ginástica. Porém, esse cotidiano é tão fracionado que
transforma em forma caótica (irreal?) tudo o que toca.
O
ator/protagonista (João Velho) sustenta com fôlego e convicção os impactos do
mundo moderno, o mesmo acontecendo com a mãe (Daniela Galli), e as namoradas Ângela
(Paula Braun), e Laura (Beatriz Bertu). Não é uma peça de fácil elaboração,
percebemos o pêndulo do tempo acelerando as interpretações. Nesse sentido, o
personagem do pai (Adriano Saboya) é o menos solicitado. O mesmo não se pode
dizer do amigo (Átila Calache?), que se desenvolve em absurdos do inconsciente.
Uma comédia contemporânea, que oscila entre teatro, e a compreensão de um
possível teatro de união de linguagens - sendo a comédia a dominante - sobrepujando
o drama do desencontro dos amantes. Concordamos com o diretor quando nos diz
que é uma comédia que beira o politicamente incorreto. Algo que desequilibra a platéia.Ótima a cena do debate político invertendo a tela da Tv. Todo o elenco e, além dos já citados: Christian Landi.
A trilha sonora de
Átila Calache e Tato Consorti é a responsável
pelos bons momentos da ação, o mesmo podendo-se dizer da iluminação de Tomás
Ribas. A direção de movimento é de Marcelle Sampaio: certamente, colocar esse
relógio de precisão, que é o movimento dos atores, em boa sintonia, não deve
ter sido trabalho fácil. A cenografia
hiperrealista é de Aurora de Campos. Os figurinos de Antonio Guedes reforçam o
clima realista e enfocam épocas (veja-se o guarda roupa elegante da mãe anos 50).
“Realismo” é uma comédia instigante, que faz pensar e divertir. Não percam!
Nenhum comentário:
Postar um comentário