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sábado, 18 de maio de 2013

"A IMPORTÂNCIA DE SER PERFEITO"

Elenco de "A Importância de ser Perfeito", de Oscar Wilde. Da esq. p/ a dir. (acima) Pedro Tomé (Pastor); Marcio Fonseca (Dona Glorinha); Andereson Mello (Tia Augusta); Samuel Toledo (Felicio  ou Ruas).
    Na linha de frente: João Pedro Zappa (Cecília, e seus cabelos de campo); Leandro Soares (Agenor);  Leandro Castilho (José) e George Sauma (Patrícia).     
                 (Foto Dalton Valério)



CRÍTICA TEATRAL

IDA VICENZIA FLORES

(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)

(Especial)



Uma inteligente montagem de Oscar Wilde. Com citações da nossa realidade, a essência do dramaturgo e dândi irlandês está intacta. Trata-se de mais uma arriscada versão deste autor, já que voltamos aos primórdios do teatro, como nos tempos em que as mulheres não eram permitidas a bordo. Há, neste tipo de esptáculo, pequenos riscos de entrar no terreno da comédia besteirol com travestis (e, perigo maior: pode uma facção mais ortodoxa de nossos críticos assim julgá-la). 

     Mas qual! Ao ter início o espetáculo, com aquela banda reproduzida pelos atores, e abrindo com os compassos de Steppenwolf ("Born to be Wild"), "A Importância de ser Perfeito", de Oscar Wilde, Daniel Herz e Leandro Soares conquista ao primeiro som (com música e letra adicional de Leandro Castilho). O cenário convencional de uma Inglaterra vitoriana é descartado: por detrás de panos transparentes passam-se as mudanças. Ah, para que todas aquelas montagens de "A Importância...", com aquelas imagens primaveris de chaise longues e cadeiras de jardim...? Aquilo é passado. O cenógrafo Nello Marrese nos brinda com algo totalmente inexistente, nesse aspecto. Para ele, o cenário é composto de quatro cadeiras, alguns objetos de cena e uma cortina de fundo.

     A luz de Aurélio De Simoni e os figurinos de Thanara Schönardie preenchem algumas carências do cenário. E o diretor optou, para enriquecer as cenas, colocar as falas de alguns personagens (eles são 25, ao todo, no original), diluídas no conjunto, para dar movimento à ação. 


      Os intérpretes, autorreferenciados como "Coletivo Achado Numa Mala", vindos, alguns, dos Atores da Laura (Anderson Mello é a "nossa" tia Augusta (Lady Bracknell), o maravilhoso personagem de Wilde que retrata os preconceitos de uma classe social que se diz privilegiada. (Inesquecível a frase de tia Augusta decretando que "só fala mal de sua classe quem não pertence - mas quer pertencer - a ela..."). O tradutor e adaptador Leandro Soares nos dá uma versão micro do texto de Oscar Wilde.  


     Uma das versões levadas à cena no Brasil, na íntegra, foi protagonizada por Nathalia Timberg (Lady Bracknell) e Barbara Paz como a Srta Gwendolen (podem vocês imaginar a tradução do diretor para a jovem ardilosa). Pois essa versão pecava por ser muito reverente ao autor, não possuia o descaramento saudável e transgressor (Wilde aprovaria) da atual, não possuia o envolvimento de folhetim dessa "comédia frívola para pessoas sérias". As duas mocinhas (Cecília, João Pedro Zappa) e Patrícia (George Sauma) estão de tal maneira dentro de seus papéis que, em dia de estreia, o figurino de George despencou, e "ela" observou, com naturalidade: "fiquei nua!" Era uma mocinha ajeitando a saias, com a ajuda de Cecília. A platéia aplaudiu. 


     Os arranjos para casamentos de conveniência (para os jovens seria um casamento por amor), correm soltos, em meio a serviços de um buffet de canapés de pepino proporcionados por um hilário (e discreto) serviçal, interpretado por Samuel Toledo (em dois personagens: Felício e Ruas). As críticas ao momento atual de nossa sociedade estão presentes, principalmente com o pastor Saulo (Pedro Tomé) representando os descaminhos de qualquer religião (estava inseguro, na estreia. Poderia enlouquecer mais), e Dona Glorinha (Marcio Fonseca), como a fofoqueira folhetinesca. Eles são quatro, dos inúmeros personagens secundários de Wilde que sobreviveram, e são imprescindíveis para a peça funcionar.  
  

     Tudo se passa entre Londres, e a "casa de campo" - do civilizado ao "rustique". Para tia Augusta o campo é folclórico em demasia. Os figurinos são um espetáculo à parte, junto com a direção imaginada por Daniel Herz, onde os sexos são estimulados por esboços "andróginos" (para muitos, a sexualidade do futuro). Nomes de família, árvores genealógicas, a importância da aparência física, o camuflar a idade, o trato ao subalterno, as manias, a vaidade exacerbada e muito mais é apresentado, entre uma frase de espírito e outra: como é notório em Wilde.   


     A inspiração para essa montagem vem de José Celso Martinez Correa, que apresentou aos atores o livro da americana Camille Paglia sobre o irlandês. O desafio de olhar Wilde sobre esse prisma foi aceito, e daí surgiu essa direção precisa de Daniel Herz, cujo detalhes na interpretação dos atores vem unir-se ao trabalho de tradução de Leandro Soares. Esse ator/tradutor interpreta um dos apaixonados. 

     O texto, partindo de um enredo cotidiano, deflagra uma ação simples em aparência, porém com profunda reflexão de costumes. Em meio às incertezas reinantes, os dois Leandros, Soares e Castilho, interpretam os apaixonados Agenor e José: eles querem ser rebatizados para agradar às suas amadas. Como a história é bastante conhecida, abstemo-nos de relatá-la. A aconselhamos ao público. São momentos de teatro insólito e extravagante. E o elenco como um todo, principalmente os cinco protagonistas,  respira inteligência. Uma delícia. 


FICHA TÉCNICA ADICIONAL:


Assistência de Cenografia: Lorena Lima


Assistência de Iluminação: Ana Luzia De Simoni


Direção de Produção : Tárik Puggina

Assessoria de Imprensa: Daniella Cavalcanti      

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