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domingo, 27 de novembro de 2016

"CÉUS"

Elenco de "CÉUS", de Wajdi Mouawad, direção Aderbal Freire Filho. (Foto Leo Aversa).

IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)

"CÉUS" - ESSE É O FUTURO QUE NOS AGUARDA?

     Há um erro fundamental no texto pró-Ocidente do libanês Wajdi Mouawad, além o de manipular emoções: ele se esqueceu de levar o ataque "dos jovens kamikazes românticos" até o distante Texas, nos EUA, onde se abriga - esse sim - o maior criminoso de guerra do século XXI: George W. Bush. Por que não incluí-lo como o principal responsável pelos ataques aos museus ocidentais, já que ele proporcionou o maior deles, ao estimular o saque ao Museu de Bagdad, acabando com uma historia que, para nós, ainda não foi contada... e dando partida ao texto que segue: o da destruição total dos dois mundos.

      Foi-se a Arte e a Memoria de um povo, e a peça lamenta o tempo da destruição da arte ocidental... Constatamos, em "Céus", que o ataque terrorista torna-se um acontecimento tão "preciso", em termos de tecnologia, que bem podemos imaginar a recíproca e, derrotados todos, partirmos para o "planeta vermelho"... (é o que parece estarem preparando, os nossos contemporâneos). E o teatro entrou nessa dança! Em todo caso, não escapamos nunca do vermelho... para o bem ou para o mal.

      A peça transcorre em um tempo indefinido, e a tensão imposta atinge extremos, lutando entre o veraz e o inverossímil, fato esse que é muito perigoso para a arte. O perigo está em a peça caminhar naquele fio estreito entre o riso e o pranto. Os atores, muito bons, seguram essa barra pesada, no entanto, não podemos resistir a algo que soa falso, em todo esse terror insuflado pela imaginação e a tecnologia!

     Resumindo: o autor imaginou um tempo em que o terror está prestes a dominar o mundo e estabelecer a barbárie. Mas está mesmo? Um pouco mais além seria atômico, um pouco aquém, histeria incontrolável. Queremos enfrentar este texto?

     Quatro cientistas estão trancafiados em uma espécie de "bunker" pós-revolução tecnológica, esperando decifrar a senha e a missão que um quinto componente da equipe guarda com ele. Este componente, Valéry, que aparece com a imagem do diretor Aderbal Freire Filho, é o encarregado de levar a pesquisa adiante. Desiste, e deixa o barco (o computador...) à deriva. Os outros quatro entram em pânico, sabem que algo incontrolável acontecerá no dia de Nossa Senhora da Anunciação, dias contados. Há o quadro de Tintoretto, há a pomba maluca e há o mapa configurando o local dos quatro ou cinco museus que sofrerão o ataque dos terroristas. Quem são eles? O que querem eles, os terroristas, afinal? É uma luta de civilizações, ou uma luta de gerações? Neste impasse somos colhidos em uma guerra que não nos pertence; nós não somos George W. Bush, não vivemos no Texas, não temos duas filhinhas "encantadoras" e uma mulher ideal. Portanto, essa não é a nossa guerra.

     Entretanto - e o autor nos desculpe - os atores fazem o possível para tornar verossímil tal situação. Pode até acontecer - o nosso mundo está (é) tão louco - mas as bases não se sustentam, e então vemos uma cientista, (Silvia Buarque), tentar contornar a situação e só conseguir o seu retorno à "humanização mais palpitante" porque vai ser mãe! O "salvador da pátria", (Felipe de Carolis), se atrasa e não consegue deter a catástrofe terrorista "ameaçada" por alguém que não se controla (Rodrigo Pandolfo/Vincent Chef Chef), em missão que exige sangue frio: e tomamos conhecimento de mais esse vilão ambicioso. E assim sucessivamente: Blaise Centier, personagem de Isaac Bernat, com a sua bondade e indefinição, não consegue dominar a situação, deixando a catástrofe acontecer! Isaac não tem muito a realzar, com tal personagem... Somente a dupla pai e filho passa um sentimento familiar e humano: pai (Charles Fricks) e filho (Antonio Rabelo) - um jovem cuja naturalidade vale o espetáculo - acabam por nos envolver em uma armadilha - pressentida, porém impossível de ser evitada. Conclusão: essa historia de crianças mortas em uma guerra estúpida estabelece o momento em que pedimos, silenciosamente, que essa sangria, acontecendo em nossos dias, seja detida.   
      
      O cenário é composto por uma mesa que centraliza a ação, com os seus computadores (Fernando Mello da Costa). Os figurinos do cotidiano (século XXI),  composição de Antonio Medeiros. Música e desenho sonoro: Tato Taborda. Iluminação: Maneco Quinderê. Como podemos perceber, uma ficha técnica tão potente quanto o elenco. Tradução de Ângela Leite Lopes; Direção: Aderbal Freire Filho. Assistente de Direção: Fernando Philbert. As projeções são um espetáculo à parte. Realização do Projeto: Felipe de Carolis.

HÁ, NESTE TEXTO, UMA CONSTRUÇÃO ANCESTRAL, UMA VARIAÇÃO QUE VEM BROTANDO, E NÃO SE CONCRETIZA... TALVEZ A ISSO SE CHAME "POESIA"!   

Um comentário:

  1. Autocrítica... dá-me prazer desobedecer os cânones da crítica oficial e colocar a minha opinião muito particular nesta crítica, inclusive me referindo ao que "o autor", (vejam só!) deveria ter feito! É que a lembrança do assassino George W. Bush, envolvido em toda essa situação, me tira do sério!

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