Leonardo Netto e Hélio Ribeiro em "Freud - A última sessão" (foto divulgação) |
CRITICA TEATRAL
IDA VICENZIA FLORES
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro – AICT)
(Especial)
Entretanto, palco
e plateia participam de momentos deliciosos de puro prazer teatral, fortemente
influenciado pelo dialogar primoroso dos dois personagens. De nacionalidades
diversas, o irlandês Lewis e o austríaco Freud compartilham da mesma
preocupação com o futuro da civilização.
Se o ceticismo aparente de um, e a boa vontade do outro os mobiliza, os “chamados da natureza” em declínio vão se
tornando cada vez mais prementes para Freud (a ação se passa em 1939, o ano de
sua morte). Lewis, muitos anos mais
jovem – o embate se dá entre um homem de 73 anos e um jovem na casa dos 30 – apresenta
outras preocupações.
O embate se dá no
já famoso consultório de Freud, dessa vez na Inglaterra, durante a sua fuga do
nazismo. Trata-se de um bom pretexto para o autor colocar em jogo
acontecimentos históricos grandemente reveladores da alma dos dois “contendores”.
No papel de Freud temos o ator Helio Ribeiro, em impressionante absorção da
personalidade do pai da psicanálise. A perfeição da composição é tão detalhada
que, por momentos, temos a impressão de estar na presença do mesmo. Se
houvesse, no Brasil, prêmio para composição de personagem, com certeza Ribeiro
ganharia em todos os itens. Não se trata de um “ator camaleão”, porém de um
autêntico identificador de almas.
Imagina-se que a
composição de Freud por Ribeiro tenha a intervenção cuidadosa de Ticiana
Studart, premiada diretora, novamente na direção de espetáculos após seis anos
de ausência dos palcos. Compondo a dupla
de atores, Leonardo Netto surpreende com a emoção se desdobrando entre o
convicto defensor de suas idéias e o emocionado amigo (em que se transforma,
durante a peça), de Freud. Netto desenvolve a sua composição entre o solícito e
o irônico.
Há, no espetáculo,
o ácido humor judeu e as observações cáusticas do irlandês assimilado pelos
ingleses, sendo um bom cartão de visitas a frase “Nós, os ingleses, levamos o
senso de humor muito a sério”. Há frases do ideário judeu de Freud, tais como “A
Bíblia é ao Bestiário da Sexualidade”, ou “A Religião fez do mundo um grande
berçário”, em oposição às de Lewis, “O amor de Cristo é um mito que é também um
fato”, ou “Os mitos são verdades impossíveis de serem ditas”, transforma o
espetáculo em um duelo bem-humorado, entre um católico defendendo suas
contradições, e um ateu convicto. Espetáculo imperdível, por seu texto e sua apresentação/recepção
– ou seja, a comunhão entre atores e público.
Com produção de
Cássia Vilasbôas, tendo José Dias como cenógrafo - acertando no alvo e compondo,
com a iluminação de Aurélio di Simoni, uma dupla imbatível. Figurinos corretos de
Kiara Bianca. Direção de movimento de Sueli Guerra, e direção musical de Marcelo
Alonso Neves. É bom ver bom teatro!
Nenhum comentário:
Postar um comentário