Cena de "Marcha para Zenturo", dramaturgia de Grace Passô, direção, Luiz Fernando Marques. Coletivo XIX/Espanca! (foto Divulgação) |
CRITICA TEATRAL
IDA VICENZIA FLORES
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro – AICT)
(Especial)
Já dizia Camus
(o argelino Albert), nos idos dos anos 40, do século XX: “num universo
repentinamente privado de ilusões e de luz o homem se sente um estranho”. Essa
seria uma afirmação que conduziria, no pós-guerra, ao rótulo “Teatro do Absurdo,
o estranho”. Mas não é coisa do pós-guerra, a juventude de hoje continua a se
sentir um estranho neste mundo. Ou ao menos a juventude que pensa. Nela podemos
incluir dois grupos que se apresentam, até o dia 20/01, ou seja, até amanhã, no
Teatro Nelson Rodrigues, no Rio de Janeiro. Essa fusão de trabalho, essa união
entre grupos, o mineiro Espanca! e o paulistano Grupo XIX de Teatro, apresenta
uma visão desesperançada do presente (e do futuro).
Na verdade, os dois grupos estão trabalhando
com o “Teatro do Absurdo” (com pitadas de ficção científica), ou nele inspirados
(talvez mesmo sem o saber): Beckett, Ionesco, Adamov, Genet, e mesmo Harol
Pinter! Autores tão díspares subitamente viram-se navegando no mesmo mar. Entretanto,
o mesmo não havia ocorrido (ainda), com os brasileiros, ou melhor, com os
grupos jovens como o Espanca! e o Grupo XIX. O parentesco tornou-se óbvio, ao
menos com o Grupo Espanca! já em 2008, quando
os mineiros aqui estiveram com a peça “Congresso Internacional do Medo”,
inspirada em poema de Drummond.
Agora, no comentado “Marcha para Zenturo”,
os dois grupos se unem para fazer um espetáculo estranho. O Grupo XIX existe
desde o início do século XXI (como o Espanca!), e coleciona prêmios com
montagens de títulos sugestivos, tais como Hysteria, Hygiene, Arrufos, e agora
esse “Marcha para Zenturo”, com direção de Luiz Fernando Marques (Grupo XIX) e
dramaturgia de Grace Passô (Espanca!). Neste espetáculo ficamos sabendo da
identificação de ambos, e seus questionamentos sobre estilos e escolas.
“Zenturo” é um possível lugar no futuro,
ou um grito de guerra para uma revolução? Nada fica bem claro, na correria
louca de incomunicação e amizade que se estabelece no palco, nessa comemoração do novo ano 2400
e tal. Ficamos com a impressão de que há uma falha na direção, e o reencontro entre
amigos não acontece, ou fica somente esboçado. A ação começa a se tornar
intrigante a partir do momento em que se intercalam várias situações envolvendo
passado e futuro, com atores tchecovianos convivendo com os agitados atores do
século 2400. Há comentários desses “seres do futuro” (em tudo semelhantes aos
seres do nosso presente), a respeito dos atores do passado: “Como eles são
técnicos!”. A junção entre A Gaivota e Nina - com seu realismo -, e o Teatro do
Absurdo é uma opção do diretor e da autora, que foram beber na mesma fonte.
Resumindo:
o que parecia, a um primeiro contato, uma algarravia de atores perdidos no
palco, vai aos poucos fazendo sentido, e vamos compreendendo o choque entre
passado e futuro. Aí começa a se esboçar um estilo “ficção científica-ao-contrário”,
com os “futuristas” (se assim os podemos chamar) extasiando-se com máquinas obsoletas como liquidificadores, rádios,
engenhocas eletrônicas do início do século XXI, e o funcionamento do corpo
humano no longínquo 2012, ou, ainda, a obsolescência da religião... A proposta
do espetáculo acaba se esboçando, embora fique apenas em uma promessa.
No elenco não há destaques. Aqui e ali
identificamos atores do Espanca! tais como o personagem Gordo (Gustavo Bones),
ou Marcelo Castro (Patalá), além, claro, de Grace Passô, dessa vez mais autora
do que atriz, repetindo gestos que se tornaram a sua marca registrada. Do Grupo
XIX pouco (ou nada) conhecemos. Os atores, em geral, cumprem com eficácia os
seus papeis. Interessante o destaque dado ao personagem Marco, o enfermo
(Rodolfo Amorim), e a crítica que o “coletivo” faz à Medicina. Aguardamos com
ansiedade a incursão de “Hysteria”, do Grupo XIX, nos palcos cariocas. (Perdoem
se eles já andaram nesta capital. Neste blog sou “a primeira crítica desligada”
(embora eficaz), e não me incomodo com rótulos!). Quanto ao mais, registro a
ficha técnica. Interessante a movimentação do cenário, o brinquedo com o gelo -
que pode ter muitos significados - e a projeção da plateia, ao fundo do palco.
Ficha Técnica:
Concepção do
Espetáculo: Grupo XIX de Teatro e Espanca!
Direção: Luiz
Fernando Marques
Dramaturgia:
Grace Passô
Elenco: Grace
Passô (Nina), Gustavo Bones (Gordo), Janaina Leite (Noema), juliana Sanches
(Lóri), Marcelo Castro (Patalá), Paulo Celestino (Boris), Rodolfo Amorim
(Marco), Rodolfo Serruya (Konstantin) e Mariza Junqueira (Noema) – Temporada
Rio
Iluminação:
Guilherme Bonfati
Projeto
audio-visual: Pablo Lobato
Treinamento de
viewpoints: Miriam Rinaldi
Oficina de
Interpretação: Ana Lúcia Torre (a conhecida atriz?)
Cenário: Luiz
Fernando Marques (que também assina a trilha sonora), Marcelo Castro, Paulo
Celestino e Rodolfo Amorim
Figurino:
Gustavo Bones, Janaina Leite, Juliana Sanches e Ronaldo Serruya
Assessoria
Imprensa no Rio de Janeiro: Astrolábio Comunicação
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