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terça-feira, 14 de maio de 2013

"O TEMPO E OS CONWAYS"

Elenco de "O Tempo e os Conways"
                                                                (foto de Guga Melgar)       



CRÍTICA DE TEATRO

IDA VICENZIA FLORES

(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)

(Especial)


Cumprindo este início de temporada teatral carioca, eis que surge uma peça que vem complementar o ciclo dominante de "revisão do comportamento familiar" estabelecido em nossos palcos. Dessa vez trata-se de "O Tempo e Os Conways", de J.B. Priestley, dirigido por Vera Fajardo, e levado em cena na Casa da Gávea.  O problemático espaço cênico da Casa é brilhantemente contornado pela concepção de cenografia de Mirella Maniaci, cujo recurso ao papel de parede unificando o ambiente -   entrada, portas e aberturas, saguão e palco -  dão a sensação de cena e ação expandidas. Para quem está acostumado ao espaço da Casa da Gávea, esse recurso é realmente surpreendente.
     No saguão, logo após a escadaria (que também é utilizada na ação), o piano e o canto de Kaleba Villela recepcionando o público e dando o colorido da época. Cole Porter, o americano, é  interpretado por Villela. Em  "O Tempo e os Conways" é  a história de uma geração, sendo  a trajetória dos Conways um reflexo dos acontecimentos vividos pela aristocracia inglesa  entre o fim da Iª Grande Guerra e os anos 30. O drama possui um sabor tchecoviano (pela falta de preparo dessa classe para viver a adversidade) e coloca, para  o público, problemas e escolhas que se assemelham aos de  "O Jardim das Cerejeiras", ou seja:  seguir os novos tempos, ou sucumbir. E sempre há um Lopakin (no caso, Ernest  Beevers, o comerciante,  interpretado por Marcéu Pierrotti), para estabelecer a ascensão inevitável do futuro, da classe média (no caso). Tal como acontece com os personagens de Tchecov. Compete ao público tomar conhecimento  do impasse.
     Assim relatado, parece que estamos nos referindo a um requentado thriller dos problemas de ascensão de classe. Puro engano. A transição que se concretiza no palco de Priestley, sob a direção de Fajardo, segue a escrita da escola clássica, sim (com orientação de Renato Icarahy), mas  salva o espetáculo de se tornar um déjà vu. Há uma inquietação constante que pertence ao texto, e  cuja proposta é a investigação da alma humana e das escolhas de vida. Acrescente-se a isso o jogo do autor, colocando  a juventude e a beleza do elenco sobrepondo-se ao inevitável, e teremos a adesão do público, predisposto a tomar parte no drama, a recebê-lo com simpatia. 
       O viver à beira do abismo, a inconsciência, o charme da  juventude, faz as pessoas acreditarem estar na presença de seres perfeitos e imortais. É somente quando a sensação de tragédia eminente se estabelece, e a realidade se torna mais forte do que o sonho, é que o público percebe que a ação, no palco, não se caracteriza como sendo a  de uma comédia. Em Priestley não há ironia, como em  Tchecov.
     Os personagens, diversificados (há o amigo da família(o advogado Thorton) , a apaixonada (interpretada por Maria Ana Caixe), o homem de negócios), enfim, são tipos que estabelecem a variedade humana e estão visceralmente ligados ao tempo, ao efêmero. E aí passamos aos acertos na escolha do elenco: a mãe, interpretada com arrebatamento por Stella Maria Rodrigues (atriz convidada), mulher vaidosa e frustrada - e o caráter dos filhos - o pusilânime; o sonhador; a intelectual, enfim - uma sequência de tipos muito bem desenhados, em contraposição à cena, que é leve a frívola, principalmente no início da peça. Os filhos são interpretados por Igor Vogas (Alan, o sonhador); Johnny Massaro, (Robin, o bêbado); Julia Fajardo (Kay, a desiludida); Camila Moreira (Hazel, a bela); Mariela Figueiredo (Maggie, a socialista) e Tahis Muller (Carol, a caçula talentosa). Os amigos e namorados (já citados) não lhes ficam atrás. O entrecho é complementado pela  a ação do advogado, o qual assume a consciência dessa classe inconsciente que é a aristocracia (Pedro Logan interpreta o advogado Gerard Thorton).
     A iluminação, impecável criadora de ambientes e passagens de tempo - de Paulo César Medeiros - complementa o fugaz. Os figurinos, excelentes, de Paula Accioli, são destacados pelos rituais de mudança (como no caso de Kay, entre outros), que sinalizam a passagem de tempo. A precisa direção de movimento é de Duda Maia. Preparação vocal, teclado e trilha sonora de Kaleba Villela (o último item, acompanhado por Vera Fajardo). Assessoria de Imprensa Bia Sampaio; Renato Icarahy é também o tradutor da peça; Produtor Associado, José Mayer. Trata-se de um espetáculo cuidado, que merece a atenção do público.               
               
                   

Um comentário:

  1. Parabéns Ida,

    não vimos a montagem mas o texto da peça tem muito haver com sua critica (melhor dizendo resenha). Parabéns a todos da montagem que souberam passar o que a peça tem de melhor.

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