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terça-feira, 15 de abril de 2014

"ANA - ensaios sobre o tempo e o vento"


Angel Vianna, em "Ana", balé/teatro inspirado em Érico Veríssimo.   


IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos de Teatro - AICT)
(Especial)

Em cena, Érico Veríssimo. - ANA TERRA - "ANA - ensaios sobre o tempo e o vento", um balé/teatro dramatizado e dirigido por Marcelo Aquilo. Sua criação é livre. O adaptador elaborou licenças poéticas, como tornar vivo o personagem da avó de Ana, para o público ter a chance de assistir Angel Vianna, em sua interpretação de teatro e dança. Em cena, essa figura hierática, forte como uma mulher dos pampas, ou de uma tragédia grega! Sua participação vai além dos gestos.

Temos Denise Stutz na direção dos movimentos e Jane Duboc nos presenteando com sua doce música: "Destino", "Missões" "O Amanhã", e tantas outras. "Ana" nasceu de uma conjugação de afetos: Aquino e Angel, mestre e pupilo. Sim, o "povo da dança" os conhece bem, porém o público em geral precisa conhecê-los melhor Aconselho a todos este belo espetáculo. São coisas que nos pegam de surpresa. Aquino captou a alma da personagem Ana Terra, criada por Érico Veríssimo. Ela é o desnudamento da nossa sensibilidade.

Carol Machado é a Ana teatral. Um impressionante desempenho. Inesquecível a cena da gravidez de Ana. E Anastácia Murad é Ana menina, cantando com sua voz juvenil e afinada. O que se vê em cena são gestos, vozes, canto e música. Destaque para a cenografia de Daniele Geammal, simulando coxilhas. E para a luz de Rubia Vieira. É quando Ana fica solta ao vento, no plano superior da cena, ou na "sanga", onde ela vê a sua imagem refletida. Há os vídeos de Renato Livera que complementam a ação. Belo achado, principalmente quando coloca em cena o corpo do índio missioneiro.

Temos a bailarina guerreira que é Ana Vitória. Naquele mundo perdido só havia o rancho isolado, cavalos que as mulheres não cavalgavam, um roçado ... e a roca! (onde as mulheres trabalhavam). Os rústicos homens das coxilhas não caíram do céu, eles são paulistas que vieram pensando enriquecer nos campos de São Pedro, e não se preocupavam com a solidão das mulheres (mãe e rilha), privadas do convívio humano... e aí surgiu Pedro, vindo das Missões devastadas pelos portugueses caçadores de índios. Pedro, o índio musicista que mudou a vida de Ana.

O quadro que Aquino pinta é inacreditavelmente belo. Aquelas mulheres e seus cabelos ao vento: bailarinas/atrizes, como Roseane Milani e Ana Vitoria (expressivas em suas aproximações, olhando o público e relatando a alma de Ana com a força do seu olhar). A doce Carolina Aguiar, uma Ana pacificada (mas às vezes em fúria). Ela é a encarregada da preparação corporal, e também atuam as bailarinas Renata Costa, Sandra Alencar e Claudia Castelo Branco que colabora nos arranjos das músicas. Na realidade, há mais gestos expressivos do que dança livre. Os gestos são o tema.

Os momentos de ternura e fúria dessa mulher guerreira que é Ana, nas oito versões representadas pelas oito atrizes/bailarinas, complementam a saga da heroína. E são tantas as expressões gaúchas, que trazem saudades dos pampas: "sova", "sanga" e "salamandra" (uma lenda), lutar "de birra" contra o destino. E a referência ao "quero-quero", o cachorrinho dos pampas! Fica no ar a frase de Ana Terra: "Sempre alguma coisa importante acontece quando está ventando." O espetáculo é uma homenagem a todas as mulheres.


Há gaúchos na produção: o diretor Marcelo Aquino, e o assistente de direção Cleiton Echeveste. O solo e a terra natal de Érico Veríssimo estão presentes nesta montagem. Em tempo: a preparação vocal é de Gabriela Geluda e os figurinos inspirados nos panos e rendas da região, de Ticiana Passos. O visagismo, que tanto aproxima as bailarinas das imagens gaúchas, é de André Vital. A trilha sonora original é de Jane Duboc e Felipe Dias. Não percam este espetáculo! Ele é sobre delicadeza e sofrimento. O contexto, figurinos, cenário (ótimo espaço), iluminação (e os cabelos ao vento...), encarregam-se do clima. Nem é preciso dizer que as pessoas apaixonadas pelas artes devem assistir a este espetáculo. E as que não são também, para entender o significado da poesia.

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