O psicanalista Davi Wunschmann (Antonio Quinet), a apresentadora Miranda Souza (Aline Deluna) e Sigmund Freud (Samir Murad), em "O Ato - variações freudianas - 2" |
IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos de
Teatro - AICT)
(Especial)
Quero
ressaltar que "O Ato - variações freudianas - 2", atualmente em
cartaz no Galpão das Artes, no Jardim Botânico, texto de Antonio Quinet e direção de Walter Daguerre, é um espetáculo agradável, que relata, com certa graça, a história da psicanálise. Ele parece ser dedicado a desmistificar
os padrões estabelecidos para a questão - em geral complicados. Conhecemos o trabalho de
Antonio Quinet, sua paixão pela psicanálise e a forma inovadora pela qual ele a
revela. Em "Abram-se os Histéricos", texto de Quinet, teatro e dança sobre o encontro
entre Freud e Charcot, direção de Regina Miranda. Inesquecível.
O que se presencia agora é um texto onde Quinet brinca com a alma da platéia.
Há bom-humor e simpatia de ambos os lados. O Galpão é um local onde acontece o
teatro "para pensar". Local muito oportuno e agradável.
Quinet,
o nosso simpático e inteligente analista e autor, foi para o palco, como ator, para nos
mostrar o pensamento de Freud sobre a morte. Calma! O espetáculo não é sobre
morte, porém há um momento em que Freud quer provar que a nossa morte é sempre
um suicídio. Trata-se de um fato marcante.
Sobre
o desempenho dos atores, infelizmente não posso deixar de observar a voz do
psicanalista entrevistado. Mesmo sendo Davi Wunschmann (Antonio Quinet), o
"pobre diabo" de Freud. Não quero dizer com isso que o desempenho de Antonio
Quinet, esteja equivocado, somente que deve colocar, no início do espetáculo, a sua voz teatral (atenção, Rose Gonçalves!). Penso que ainda há tempo para algumas
correções.
Afora
essa observação, o desempenho de Antonio Quinet (como ator) nos traz
intervenções divertidas a respeito da televisão e do mundo mecanizado em que vivemos. É interessante, também, observar a defasagem que existe entre o analista e a sua entrevistadora. O
psicanalista entrevistado se refere ao homem biônico do futuro, o
"Deus da prótese" (observação feita por Freud), escandalizando a entrevistadora. Ficamos sabendo também
que a ligação psicanálise e auditório de televisão é uma conclusão de Lacan a respeito da platéia de seus seminários. A última cena, com o psicoanalista pensando (seu pensamento é transmitido pelo vídeo), e se recusando a dar "as palavras finas" para encerrar a entrevista, é genial.
"O
Ato" tem várias leituras. Podemos ficar só na comédia, a crítica dos tempos atuais, virtuais, pegando-o na
superfície. Mesmo assim vale a pena. O que é necessário, para o público, é
perder esse horror a Freud e a Lacan. Aliás, o último citado não aparece em
cena. As conclusões do entrevistado Davi têm muito a ver com o pensamento de
Lacan e de Freud. Somente em alguns vídeos ( e em algumas colocações do psicanalista entrevistado),
a psicologia de Lacan estará presente. Quanto a Freud, ele está ativo e lúcido desde
a descoberta do inconsciente, até as suas conclusões finais sobre a morte. No
terreno da interpretação o ator Samir Murad segura o espetáculo, o que chamo o teatro puro. Sei que essa foi a intenção, essa divisão de linguagens. Devo dizer que a
caracterização de Freud por Murad é perfeita. Também sua presença em vídeo, como o pai de
Dora, mostra a marca do ator. Aline Deluma (Miranda Souza) é uma revelação de
atriz cômica, suas intervenções como apresentadora são precisas e hilárias.
Temos
algo precioso para ilustrar sobre psicanálise, além do programa surreal de
televisão. Os vídeos, mostrando o que poderia ter sido a vivência dos pacientes
de Freud e Lacan. Eles são muito bem realizados, com direção de Walter Daguerre; e Diogo Fujimura e Marcos Neves na sua realização. Vemos em cena o "Caso
Dora" (a protagonista é interpretada por Julia Bernat, uma bela e
excelente atriz), e também o depoimento de uma ex-paciente de Lacan, Cristine (interpretada pela
grande atriz que é Ângela Rebello, quase irreconhecível em seu despojamento). E
ainda o Sr. K, o "dissimulador" do Ato Falho? (Raul Serrador). No encontro da família de Dora, ao redor da mesa de jantar, podemos ver sua mãe (Mônica Daguerre), o pai (Samir Murad), a bela Sra. K (Samantha Gilbert). Na ocasião, Dora faz um irônico brinde, deixando sub-entendido o que se passou entre ela e o Sr. K. (neste momento a atriz Julia Bernat mostra também seus dotes de cantora). Há o depoimento da jovem homossexual, interpretado por Pamela Coto, e a mulher violentada pelo marido em sua noite de núpcias, interpretada por Juliana Terra. Os vídeos trazem um panorama esclarecedor sobre a psicanálise.
O
desempenho dos atores, no vídeo, prima pela perfeição cinematográfica. Os figurinos de época (Isabela Massi) são marcantes, tanto nos
vídeos, quanto na apresentadora de televisão. Eles mostram a moda do final do
séc. XIX, e do início do século XX. Uma coisa encantadora no espetáculo são os
movimentos - cinematográficos - das "tomadas" e dos atores nos
vídeos.
O
cenário, com variações e transparências, é de Aurora de Campos. Ela consegue
colocar em cena, naquele espaço mínimo do Galpão, uma emissora de televisão, um
escritório, e ainda a sala em que Freud recebia os seus analisados, com o famoso
sofá. Há o software "(citado
pelo entrevistado) "Freud is alive". Concluímos que é por essa razão,
e não pelo "cosmos", que Freud está presente, e "vivo", em
cena.
Infelizmente
- e devo dizê-lo - , "Variações", ou "O Ato", está mal
lançado. A começar pelo programa da peça. Ele não dá a mínima pista do que será
o espetáculo. Graças a Deus, quem
vos escreve e critica, neste momento, encontrou a gentileza, boa educação e
informação correta, recorrendo ao psicanalista e produtor Atonio Quinet.
Além dos artistas citados, a composição e direção musical é de José Eduardo Costa Silva e a luz de Daniela Sanches. "O Ato - variações freudianas 2" é um espetáculo aconselhável, pela inteligência de seu texto e o alto nível da representação de seus atores (atenção, não se esqueçam do problema da voz!). Tenham todos um bom espetáculo!
Além dos artistas citados, a composição e direção musical é de José Eduardo Costa Silva e a luz de Daniela Sanches. "O Ato - variações freudianas 2" é um espetáculo aconselhável, pela inteligência de seu texto e o alto nível da representação de seus atores (atenção, não se esqueçam do problema da voz!). Tenham todos um bom espetáculo!
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