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domingo, 4 de março de 2018

"GRITOS"


IDA  VICENZIA

( Associação  Internacional de Críticos de Teatro - AICT)

(Especial)

                                GRITOS, um concepção de André Curti e Arthur Ribeiro encenando
                                       historias narradas por marionettes e atores (Foto Divulgação).

GRITOS
      O premiado espetáculo que nos visita é uma experiência teatral inusitada, com suas marionettes e seu não texto. Gritos - uma concepção de André Curti, Artur Luanda Ribeiro e a marionetista russa Natacha Belova - nos leva a percorrer várias formas de teatro repletas de poesia e horror. São três narrativas, desenvolvidas por André, Artur, e os bonecos que se mesclam com o corpo dos atores: Louise; O homem; e Kalsun.
     As modificações vão ocorrendo com as mudanças de luz e do cenário, composto como uma instalação artística, onde estruturas nuas de colchões de mola, "vão se transformando em objetos insólitos". O impressionante, em Louise, é a sensação de estranhamento que se levanta, quando a cena começa, carregada de intenções. Pensamos, a principio, que se trata do relacionamento sufocante entre mãe e filha (ou filho?), que a principio parece ser a oferta da cena. A incerteza que desperta o inusitado  acaba nos remetendo a uma historia de horror, impressão de desmembramento do corpo de Louise, gargantas sendo cortadas, imagens que se esfacelam, tudo nos levando à presença do teatro de grand guignol !!!
      O segundo "poema" é o esfacelamento do homem, e a impressão continua, reforçando a sensação de teatro aos pedaços. Para os atores trata-se de "um poema gestual entre o sonho, o onírico e o absurdo". Claro, pode ser. O que faz sentido é a força das imagens que os dois artistas conseguem, com este experimento absurdo que acaba por nos abstrair do seu componente humano. É impressionante a semelhança dos atores com os personagens masculinos que manipulam!
     A última imagem deste "Grito 1" é a mãe solitária, na cena que se dilui, dando-nos a impressão de um "ser humano" - e não um boneco - abstraído dos acontecimentos que o rodeiam. Mais uma vez a sensação de realidade ronda o teatro das marionetes.
     O Grito 2: "O homem" - situação insólita de uma cabeça presa em uma gaiola. Os dois atores estão em cena, afastados pelo cenário das paredes metálicas: um carrega o corpo sem cabeça do homem, e o outro ator equilibra uma cabeça, o que transmite uma sensação de angustia ver aquelas partes dissociadas (mais uma vez a sensação do teatro de grand guignol, salvaguardando os excessos da cena francesa da virada do século XX).
     No espetáculo, abstraindo a cena grotesca constatamos a expressão facial dos bonecos e se torna quase impossível dela abstrair a condição de seres irreais. Somos guiados pela perfeição de suas expressões, a ponto de nos deixar envolver poe elas. 
     Temos a impressão de que os bonecos possuem vida própria! Mais uma vez, a narrativa do esfacelamento do homem! Há, entretanto, nos gestos dos atores, na concepção do cenário, na iluminação que a tudo modifica, um clima poético que nos trás estranhamento e que continua a se desenvolver em suas pausas, silêncios, e a música evanescente. 
     "O homem" em cena, a segunda historia é a que menos carrega emoções, abstraindo a cena inicial, quando as duas metades do homem entram em cena, em um lusco-fusco e um crescendo de pássaros, quando seus braços (iluminados oníricamente) se assemelham a bicos de aves gigantes!     
     No Grito 3 - "Kalsun" - conta-se uma historia que nos enche de dor. Inicialmente somos carregados pela beleza da cena oriental, com a mulher envolta em seu xador, e seu olhar de expressão humana! Nesta historia aparece viva o confronto com a dor! Que historia terrível nos é contada! Dizem os atores que se trata de uma historia de amor. Sim, da dor do amor. Trata-se do esfacelamento de uma pequena vida (o amor), a infância!
     ... e eis que retorna o terrível teatro do grand guignol, com os pedaços da carne da criança a serem "reorganizados" para terminar a cena! 
      A mala gira, escapando da mão materna, e "o menino de olhos humanos!" aparece, temeroso do momento em que sua vida lhe escapa!
      Ficamos, mais uma vez, surpreendidos com o poder de comunicação deste espetáculo sem palavras. E, um fato que nos deve surpreender: os atores se envolvem emocionalmente com seus bonecos humanos? Impossível não se envolver, tal a perfeição da oferta. .... Aconselha-se, para quem ainda não assistiu a Companhia Dos à Deux, a não perder a essa nova oportunidade que se apresenta ao público carioca. Vida longa ao trabalho de Arthur, André e Natasha!
     Registramos da Ficha Técnica que a dramaturgia, direção, cenografia, interpretação e manejo dos bonecos são de Artur Luanda Ribeiro e André Curti. Criação musical: Fernando Mota.  Pesquisa e criação dos bonecos (além da já citada Natacha Belova), temos a colaboração de Bruno Duarte, e assistência de Cleyton Dürr.  Assessoras de Imprensa, no Rio: Bianca Senna e Paula Catunda         
      
      

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