Camila Márdila e Miwa Yanagizawa em "Naquele dia vi você sumir", direção Areas Coletivo (Foto Renato Mangolin) |
IDA VICENZIA
(da Associação Internacional de Críticos
de Teatro – AICT)
(Especial)
NAQUELE DIA VI VOCÊ SUMIR
A cena é criada pelo AREAS Coletivo,
um grupo que promove espetáculos e estudos teatrais, sediado em São Paulo. Ele encontra-se atualmente no Rio de Janeiro apresentando, até outubro, um trabalho de pesquisa
inspirado no livro de Luiz Ruffato, “Eles Eram Muitos Cavalos”, titulo que é,
por sua vez, inspirado no capítulo do livro no qual a poeta Cecília Meireles conta
os acontecimentos e personagens de nossa historia brasileira, em o “Romanceiro da Inconfidência”!
Luiz Ruffato dedica seu livro à Cecília, e cita o trecho: ”Eles eram muitos cavalos, mas ninguém mais sabe os seus nomes, sua pelagem, sua origem...” (do Romance LXXXIV “Ou Dos Cavalos da Inconfidência”). Talvez, seja essa a nossa historia, o nosso cotidiano fragmentado em cenas avulsas...
“cavalos de que não se sabe a origem” estão presentes na encenação do
AREAS Coletivo. Por sua vez, o AREAS convidou o grupo Magiluth, do
Recife, para completar a paisagem, através dos atores Giordano
Castro e Pedro Wagner.
E como ficou isso? Quatro atores completando
a experiência. O AREAS explica: “Assim, renovamos e inauguramos relações, algo
que se estende por toda a equipe, na tentativa de ressoar a natureza
colaborativa que nos é tão relevante e primordial”.
No palco, duas atrizes do AREAS: Miwa
Yanagizawa e Camila Márdila. A idealização do espetáculo foi de Camila e
Liliane Rovaris. Mas, claro, tem muito mais gente envolvida...
A cenografia é do AREAS Coletivo, e o que
presenciamos é algo insólito: no minúsculo palco do Teatro III do CCBB, no Rio,
a cena se tornou gigante. Sabem como? Aproveitando ângulos e luz, um fundo
negro e interferências... quebradas por possante iluminação (que é uma das
vozes do espetáculo), proporcionada por Beto Bruel. Entre ângulos e luzes, os
espaços se definem. Quem opera esta luz? Rodrigo Lopes e Dudu Nobre. (Engraçado,
estes nomes nos parecem velhos conhecidos...). Os figurinos, marcando
personalidades, são de Yumi Sakate, que também é a responsável pela direção de
arte.
Invertemos o processo, e a ficha técnica
veio, quase toda, no início da crítica. Tal fato acontece pela presença, muito íntima,
entre a interpretação, o espaço cênico e a indumentária. E há também a
consultoria técnica de Bruno Girello. O espetáculo é tão inesperado, como
inesperados são os cortes de cena!
Sobre o aspecto referido acima, o mais
impactante (se é que podemos selecionar impactos nesta experiência) é o cão, externando
o seu pensamento. Como vivemos cercados de cães, nunca nos passou pela cabeça (ou
passa o tempo todo...) o lado humano tão evidente que eles levam... no olhar!
Impressionante e acolhedora (no sentido de ser bem recebida pelo público), a
interpretação do animal, feita pela atriz Camila Márdila, perfeita em sua
expressão corporal. Interessante observar que o elenco feminino se distingue por
características muito próprias, em sua maneira de interpretar. Enquanto Miwa Yanagizawa
possui uma máscara facial impressionante e com ela o texto adquire força maior,
Márdila possui, além da interpretação perfeita, a força do corpo, que se
transmuta em “essências”. Olha-se, mas não podemos definir a atuação da atriz.
E o que se percebe é a voz profunda das Gerais sugerindo uma vida em comum. São cenas do cotidiano,
imaginadas por Ruffato, e interpretadas pelos atores. Além
do livro de Cecília há intervenções surgidas em outras obras de literatura (e até da filosofia!).
São escritos de Sarah Kane (Ânsia), ou de Sam Shepard,
(Angel City); ou ainda Deleuze, em “Diferença e Repetição” ... e muitos outros autores.
Vocês nem imaginam o poder cultural que o teatro está reconhecendo em si mesmo.
Vale a pena conferir.
A participação do ator pernambucano Pedro
Wagner é cativante e sutil, principalmente quando transmite as emoções de um
monólogo sobre o amor, escrito por Sarah Kane (e talvez modificado por Wagner,
mas são tão bonitas as palavras! Ouçam/leiam só!) - “e escrever poemas para
você e pensar porque você não acredita em mim e sentir tão profundamente que eu
não ache palavras para expressar esse sentimento e ... vagar pela cidade e
achar que ela está vazia sem você ... e achar que estou me perdendo e querer o
que você quer ... e me derreter quando você sorrir ... e ficar assustado quando
você estiver zangada ... (e por aí
vai!). Belo momento!
E tem Giordano Castro entrando como se um
cavalo de Ruffato fosse. E trazendo sua ternura solicita e desajeitada para sua
amada (Yanagizawa). Achamos que esta peça é um poema em prosa! E uma
constatação de nosso despreparo para a vida! Há cortes ternos, e cortes
violentos, como o impacto do atropelamento, teatralmente muito bem sucedido,
com efusões de luzes e vidros!
E é muito interessante a solução que o
AREAS encontrou para contar, em flashes, a vida no olhar de Ruffato! O AREAS
Coletivo é o encarregado da criação e direção deste espetáculo que é novidade
pura. Ah! Já ia esquecendo! A trilha sonora original é de Azul e Chad Challoub. Muito boa! Só podemos aconselhar este espetáculo: NÃO PERCAM ALGO TÃO INSÓLITO!
Eu assisti hoje e amei! Mas me parece que alguém substituiu a Camila (pelo menos hoje), você sabe me dizer quem é?
ResponderExcluirPerdão, pesquisei direitinho e era ela mesma rs aliás, muito bem pontuado o seu post, parabéns!!
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